terça-feira, 9 de fevereiro de 2021

ainda.....mutações

 

A evolução, seja de vírus ou de qualquer organismo, não segue uma caminho linear, mas sim caminhos que se dividem, onde diferentes linhagens seguem rotas evolutivas independentes. Ao longo dessas rotas, cada população de coronavírus acumula cerca 2 mutações por mês

As rotas evolutivas que cada população de vírus segue é praticamente única. Assim, ao longo de cada rota, cerca de 22 mutações ocorrem por ano, mas se somarmos as mutações acumuladas por CADA rota, chegamos a centenas de milhares de mutações

Desde o começo da pandemia, mais de 32.000 mutações mudaram não só o genoma, como também as proteínas do SARS-CoV-2. Desse modo, aquela média de 22 mutações por ano só se aplica a rota evolutiva de um único vírus: são muitas mutações, normal

A maior parte dessas mutações não são preocupantes - muitas vezes, nem tomamos conhecimento delas. Muitas delas não trazem uma vantagem para o vírus.

Mas como elas surgem?

Imagine que o vírus tem ferramentas de copiar todo seu material genético para gerar outros vírus iguais a ele. Ao longo do tempo e de tantas produções de cópias, algum erro pontual pode surgir: Ao invés de copiar a sequência CGTCGA, ele produziu CATCGA.

Eis uma mutação

Sabemos que regiões do vírus, como o domínio de ligação ao receptor (RBD) variam entre os "subtipos" de coronavírus. Essa região, que faz parte da proteína Spike, é importante pra entrada do vírus na célula hospedeira

Estudos indicam que o RBD é alvo dos anticorpos neutralizantes anti-SARS-CoV-2 identificados até o momento e várias vacinas usam o RBD como um alvo. Portanto, acompanhar essas mutações faz parte das nossas estratégias de entendimento desse vírus

Observou-se que algumas variantes emergentes na África do Sul e no Brasil apresentam uma mutação chamada E484K no RBD. Já é descrito que mutações nesse local podem ter implicações tanto na ligação com ACE2, quanto na neutralização partir de anticorpos.

Uma das evidências levantadas foi um estudo com soro de convalescente, isto é, soro de pessoas recuperadas de COVID-19 que mostrou uma redução na capacidade de neutralizar esta variante. Em algumas amostras, a neutralização ainda era observada, mas a redução chamou a atenção.

Esse achado é preocupante? Sem dúvida. Mas coloca um impedimento nas vacinas que temos? De forma alguma. É necessário uma rodada de testes com os anticorpos produzidos pelas vacinas para determinarmos se há uma redução, de fato, nessa neutralização.

Ainda, pelo fato de observarmos respostas neutralizantes, é possível que outros mecanismos relacionados a imunidade, como as próprias células específicas geradas, anticorpos para outros locais menos variáveis possam conferir uma boa proteção

Os estudos que temos hoje compreendem poucos indivíduos para batermos o martelo, mas um alerta está sendo dado há vários meses: quanto mais o vírus circula e infecta diferentes hospedeiros, mais estaremos vendo mutações e surgimento de variantes

A baixa adesão a medidas de enfrentamento (quais medidas? o uso de máscara, o distanciamento físico, evitar aglomerações, preferir ambientes arejados/ar livre, higienização) são diretamente responsáveis pelo aumento da circulação do vírus

 

Variante P1 - Brasil

É preocupante sim! Mas não significa que, nesse momento, as vacinas não vão funcionar.Uma preocupação crescente.

Cronologicamente, o governo do Japão anunciou, no dia 10/01, que detectou em seu território uma nova variante do coronavírus, em quatro viajantes que vieram do Brasil para o Japão

Voltando para o contexto do que acontece no Brasil, a pandemia do SARS-CoV-2 aqui foi dominada por duas linhagens designadas como B.1.1.28 e B.1.1.33 que provavelmente surgiram no país em fevereiro de 2020.

No final de 2020, um estudo descreveu uma nova variante no RJ que se distinguiu por cinco mutações, incluindo uma na proteína Spike (E484K), também detectada no B .1.351 (linhagem Sul-Africana)

Essa variante B.1.1.28 (que contem a mutação E484K), foi posteriormente detectado em outros estados brasileiros e ainda associado a dois casos de reinfecção em pacientes originalmente infectados pela linhagem B.1.1.33.

Segundo o estudo brasileiro, 148 sequências do genoma completo SARS-CoV-2 do estado do Amazonas foram analisadas, identificou-se 69 (47%) sequências B.1.1.28 de diferentes municípios entre 13/04 e 13/11/2020, sendo a linhagem viral mais prevalente em neste estado brasileiro

Após + análises no trabalho, com 18 novas cepas da região coletadas entre o mês 5 a 11/2020, suportam que as cepas SARS-CoV-2 B.1.1.28 em viajantes japoneses retornando da região amazônica brasileira provavelmente evoluíram de uma linhagem que circula no Amazonas desde Abril/2020

Ainda, os dados preliminares apontam que a rápida taxa de mutação detectada na nova linhagem P1 é um fenômeno recente que provavelmente ocorreu entre dezembro de 2020 - janeiro de 2021.

No dia 13/01, um estudo  se propôs a investigar as linhagens recém-circulantes em Manaus, em 37 amostras de pacientes entre 15-23/12/2020

Esse estudo reveliu que, desses 13 indivíduos (ou 42% do total) apresentavam justamente essa nova linhagem, chamada de linhagem P.1 (Manaus, "descendente" da B.1.1.28)

Na P.1, dentre as alterações presentes, encontra-se 2 mutações de interesse, ocorrendo na Spike:

- E484K ocorre no domínio de ligação ao receptor (RBD) que o vírus usa para se ligar ao receptor ACE2 humano

- N501Y também ocorre no RBD do vírus (comentada anteriormente)

Ambas as mutações compartilhadas entre P1 e B.1.351 (África do Sul) parecem estar associadas a um rápido aumento nos casos em locais. Portanto, é essencial investigar se há um aumento na taxa de reinfecção em indivíduos previamente expostos.

E também aguardar como serão os estudos de eficácia das vacinas.

 

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