Em 24 de Agosto pesquisadores em Hong Kong anunciaram o primeiro caso confirmado de reinfecção pelo SARS Cov 2.
Um paciente de 33 anos , saudável , morando em Hong Kong desenvolveu 3 dias de sintomas respiratórios e foi testado positivamente para o vírus em 26 de Março. De acordo com o protocolo local foi testado mais duas vezes a fim de liberar do isolamento e ambos os testes foram negativos. No dia 15 de Agosto ele foi testado novamente como parte de um controle de triagem no aeroporto de Hong Kong após voltar de uma viagem à Europa.Este novo teste resultou positivo.O paciente estava assintomático. O sequenciamento genético revelou que os vírus isolados em Março e Agosto eram diferentes
Nos ultimos meses vários relatos de prováveis casos de reinfecção têm aparecido na literatura médica. A maioria baseou-se apenas na identificação de positividade do PCR havendo dúvidas se não se estaria detectando apenas material de fragmentação do vírus. Na maioria dos casos não foram feitos cultura viral nem sequenciamento genético comparativo.
Após a publicação deste caso , um novo relato detalhado foi feito nos Estados Unidos. Um paciente de 25 anos, saudável , morador de Nevada , desenvolveu sintomas de infecção respiratória em 18 de Abril e testou positivo para COVID. Dois testes realizados em Maio foram negativos. No final de Maio ele desenvolve novamente sintomas e testa positivo. Durante este segundo episódio ele precisa ser hospitalizado para oxigenioterapia. Sequenciamento genético revelou que ambos os isolados virais eram da mesma linhagem mas havia um numero de diferenças genéticas entre os isolados permitindo se afirmar que eram infecções distintas
A possibilidade de reinfecção sempre foi debatida durante os primórdios da pandemia. Um primeiro estudo feito em macacos rhesus expostos novamente ao vírus não eram infectados. Infecção com outros betacoronavirus que causam a SARS e a MERS parecem resultar em imunidade persistente que poderia ser protetora.
A ocorrência de reinfecção pelo SARS-CoV-2 não é surpreendente baseada na experiência com outras infecções : os coronavírus que causam o resfriado comum costumam reinfectar os pacientes num curto espaço de tempo .Durante os estudos pré clínicos da vacina de Oxford contra o SARS-CoV-2 , macacos rhesus foram infectados após a vacinação.
É possível que outros casos de reinfecção não tenham sido detectados ou não foram adequadamente investigados. Se os episódios de reinfecção forem na sua maioria assintomáticos muitos casos não serão diagnosticados.Desta forma é muito dificil predizer o real indice de possibilidade de se reinfectar
Outro aspecto a considerar é o tipo de resposta imune que o paciente desenvolve após o primeiro episódio.No caso do paciente de Hong Kong : ele foi testado 3 vezes para anticorpos IgG , 10 dias após sua primeira infecção e um e 5 dias após a segunda exposição. Só o terceiro teste resultou positivo. É possível que o paciente não formou IgGg detectável : isto tem sido visto em até 8% dos pacientes. Geralmente leva uma média de 2 semanas para a formação de IgG (portanto o primeiro exame pode ter sido feito muito cedo). No paciente de Nevada ele foi testado apenas para o IgG logo após o segundo episódio e o teste foi reagente.
Os anticorpos são apenas um dos marcadores de resposta imune ao SARS-CoV-2, e a correlação entre a presença de anticorpos e proteção imunológica é presuntiva.
Também não sabemos ainda sobre a questão do tempo para haver uma maior chance de reinfecção.Nos casos descritos : 4 meses e meio para o paciente de Hong Kong e 6 semanas para o de Nevada. Os estudos mostram que os níveis de anticorpos decaem após poucos meses da infecção mas , novamente , o papel deles na proteção imunológica não está bem definido.
Reinfecção com diferentes vírus : a proteção imunológica é mais efetiva quando o sistema imune pode reconhecer facilmente um patógeno. Por isso usamos vacinas diferentes a cada ano contra a Influenza
O SARS-CoV-2 tem uma proteína importante neste sentido - chamada S - spike. No caso de Hong Kong , os vírus das linhagem G e V tem diferenças nos genes desta proteína. Não sabemos se esta particularidade seria decisiva para determinar quem poderia ter mais chance de se reinfectar. É possível que com a flexibilizações de viagens internacionais e uma eventual exposição a linhagens diferentes de vírus possa aumentar o risco de reinfecção
Em outras doenças infecciosas é mais comum observar sintomas de menor intensidade no caso de reinfecção ou vacinação. Voltando às experiência de Oxford os macacos vacinados que foram expostos ao vírus tiveram sintomas mais leves e não disseminaram o vírus. No caso do paciente de Nevada tivemos uma experiência oposta. Mas temos exemplos em outras infecçoes : no caso da dengue , uma exposição a outro subtipo pode levar a uma forma mais grave , hemorrágica.
Em resumo : a reinfecção não parece ser um evento tão comum. Pacientes reinfectados podem ser menos transmissores do que pacientes com infecção primária. Mesmo que a vacina também não tenha uma capacidade duradoura de proteção o ideal é que ela induza a uma imunidade suficiente para os indices de transmissibilidade sejam zero
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