Ter o conhecimento da taxa de propagação de um vírus ao longo de uma pandemia é essencial para a tomada de decisões. Isso é normalmente feito através do acompanhamento de um indicador, conhecido como número efetivo de reprodução da infecção (Re ou Rt). O Re é o número médio de indivíduos contagiados por cada infectado nas condições existentes em um momento determinado.
Esse indicador permite que se projete a demanda hospitalar, o uso de medicamentos e equipamentos e medidas de contenção como quarentena e sua flexibilização. Um Re equivalente a 1 significa que cada pessoa infectada transmite a doença para mais uma pessoa. Um indicador acima desse patamar indica a necessidade de intervenções de restrição ou manutenção das medidas de isolamento. Para se adotar qualquer tipo de flexibilização, o Re deve ser inferior a 1. Países que tiveram sucesso na contenção da pandemia adotaram medidas de flexibilização com taxas de 0,7 ou 0,8.
Uma variabiliade aparentemente pequena no Re pode implicar em problemas futuros. Por exemplo, usando dados da cidade de São Paulo, em um cenário de crescimento exponencial da Covid-19, uma taxa de reprodução viral efetiva de 0,95 representaria 250 mil novos casos acumulados em um mês. Com um Re de 1,05, o número subiria para 364 mil. O Re demanda informações precisas e uma atualização constante para ser um instrumento adequado de acompanhamento da evolução da doença.
No Brasil a projeção do Re é feita levando em conta o acompanhamento hospitalar de pacientes com SRAG (Síndrome Respiratória Aguda Grave) notificados no Sivep-Gripe (Sistema de Informação da Vigilância Epidemiológica da Gripe), mantido pelo Ministério da Saúde.
É uma basebem limitada, já que entre 80% e 90% dos casos não geram internação. Outro problema é que a plataforma Sivep-Gripe é divulgada sem regularidade. Desde março, vem sendo atualizada apenas uma ou duas vezes por mês. Os dados registrados, contudo, não refletem necessariamente a informação da internação, alta médica ou óbito do dia de sua ocorrência, mas do dia da notificação.
A defasagem média entre fato e notificação é de sete dias.Isso deve ser corrigido em seu cálculo.
Existem várias formas de calcular o Re e quanto melhor for a qualidade da base de dados, mais preciso será o resultado. O primeiro passo é estabelecer o número básico de reprodução da infecção, conhecido como R0 (R zero), que mede a infectividade de um patógeno em um ambiente no qual ninguém adquiriu imunidade a ele. O R0 do vírus Sars-CoV-2, causador da Covid-19, está entre 2,5 e 3 – o que significa que um infectado contamina, em média, duas ou três pessoas.
O R0 é calculado com base em três informações: o número de contatos que uma pessoa infectada faz com indivíduos suscetíveis, o risco de transmissão em cada contato realizado e o tempo médio em que o infectado transmite a doença. Na Covid-19, a transmissão começa cerca de dois dias antes de o doente apresentar sintomas e se prorroga por mais sete.
O número efetivo de reprodução, o Re, é o R0 exposto às condições reais de evolução da doença. Portanto, muda constantemente refletindo a interação da sociedade com o agente infecioso. Pessoas que entram em contato com o agente, no caso o patógeno Sars-CoV-2, e desenvolvem imunidade, passam a não mais fazer parte do cálculo de possíveis novos casos. No futuro, o surgimento de uma vacina e sua aplicação em massa aumentará o total de imunes e, provavelmente, irá encolher o Re para um número abaixo de 1.
Em boa parte da Europa e da Ásia e em diversos estados norte-americanos, o Re é calculado olhando a situação presente. Testes regulares detectam a quantidade de pessoas que já foram expostas ao novo coronavírus e se tornaram imunes, quantas desenvolveram Covid-19 e quantas são assintomáticas. Dessa forma, o indicador reflete melhor a realidade.
O atraso nas notificações e a ausência de testagem em massa, como verificados no Brasil, obrigam os especialistas a recorrerem a algo que denominam nowcasting, a projeção do presente. Para isso, resgatam dados do passado para tentar entender o que está ocorrendo. É o que faz o Observatório Covid-19 BR, com os números do Sivep-Gripe. Outra instituição que acompanha o Re da Covid-19 no Brasil é o Imperial College, de Londres.
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