sábado, 26 de setembro de 2020

6 tipos de COVID 19

 


Recentemente, no site MedRxiv (https://www.medrxiv.org/), foi publicada a prévia (preprint, ou pré-impressão ainda sem a avaliação por revisores aos pares) do artigo que traz os resultados de um algoritmo (um algoritmo nada mais é do que uma receita que mostra passo a passo os procedimentos necessários para a resolução de uma tarefa) criado para detectar grupos (ou, do inglês, clusters) de pacientes que apresentaram diferentes sintomas da COVID-19. O aplicativo foi desenvolvido pela Zoe Global Limited, com contribuições de clínicos e cientistas do King’s College London e do Massachusetts General Hospital.

O estudo demonstra 6 grupos de pacientes com sintomas distintos, deixando claro que não se trata de nenhuma alteração genética por parte dos pacientes, ou de alguma alteração viral, que poderia acarretar em novas formas do vírus, e sim, as variedades de efeitos biológicos que o SARS-CoV-2 pode desencadear.

A descoberta trouxe os seis possíveis níveis de gravidade da COVID-19, que podem facilitar o protocolo médico inicial para cada caso, pois relacionam a probabilidade destes pacientes precisarem ou não de ventilação mecânica e a forma de se posicionar em futuras ondas de epidemias. A abordagem também pode ser usada para monitorar pacientes em risco e prever os requisitos de recursos médicos dias antes de serem necessários, com monitoramento de oxigênio e níveis de glicose. 

Os dados foram coletados de 1.653 pacientes, com idades entre 41 e 43 anos, desde o início da doença até sua hospitalização, no período de 1 a 28 de maio de 2020. Observando-se os primeiros 5 dias de registro de sintomas, foi possível detectar a necessidade de suporte respiratório em 78,8% dos casos. Dos 1.653 participantes, 383 relataram (ter feito) pelo menos uma visita ao hospital e 107 relataram a necessidade de suporte respiratório (definido como ventilação ou oxigênio suplementar)..

Os principais sintomas apontados para COVID-19, corroborando o conhecimento existente, foram dor de cabeça, tosse seca, febre, perda do olfato (anosmia) e/ou do paladar (disgeusia). De acordo com a notícia, as seis caracterizações da Covid-19 descobertas através dos algoritmos foram classificados como:

Gripe sem febre  — dor de cabeça, perda de olfato, dores musculares, tosse, dor no peito, sem febre

Gripe com febre — dor de cabeça, perda de olfato, tosse, dor de garganta, rouquidão, febre, perda de apetite

Gastrointestinal — dor de cabeça, perda de olfato, perda de apetite, diarreia, dor de garganta, dor no peito, sem tosse

Tipo severo, nível 1 — dor de cabeça, perda de olfato, tosse, febre, rouquidão, dor no peito, fadiga

Tipo severo, nível 2 — dor de cabeça, perda de olfato, perda de apetite, tosse, febre, rouquidão, dor de garganta, dor no peito, fadiga, confusão mental, dor muscular

Tipo severo, nível 3 — quadro respiratório e abdominal — dor de cabeça, perda do olfato, perda de apetite, tosse, febre, rouquidão, dor de garganta, dor no peito, fadiga, confusão mental, dor muscular, falta de ar, diarreia, dor abdominal.

Como ferramenta clínica, essa abordagem pode ser implementada em nível local, permitindo que os pacientes sejam monitorados por suas equipes de atenção primária, com sistemas de alerta acionados. Isso se torna bastante relevante nos indivíduos que demonstram sintomatologia associada a um cluster de alto risco, como os tipos severos. Integrado a este estudo, faz-se a pergunta: a sintomatologia dos pacientes seria decorrente de alguma alteração viral?

A resposta é provavelmente não. ; as regiões do vírus chamadas de S1 e do domínio de ligação de receptor (receptor binding domain ou RBD, a porção do vírus responsável pela ligação com a enzima conversora de angiotensina, ACE2, das nossas células) que se encontram na proteína do vírus chamada Spike são muito pouco afetadas por mutações comuns (diferentemente de outros segmentos do SARS-CoV-2). 

Somado a isso, a presença e o número de determinadas células do sistema imunológico, como os linfócitos, e das moléculas produzidas por elas geram uma espécie de “classificação”, que são os imunotipos. Esses perfis se relacionam com aspectos clínicos dos pacientes.Entre estes aspectos, os pesquisadores destacaram que a presença de comorbidades (diabetes, hipertensão, doenças inflamatórias, etc.) que causam manifestações clínicas mais severas, se associa à contagem alterada dos linfócitos.

 Apesar de estudos recentes estarem mostrando que existe uma certa pressão seletiva (um conjunto de condições ambientais que origina o favorecimento de determinados genes em relação a outros em determinada população para adaptação do SARS-CoV-2 em seu hospedeiro humano, segundo os pesquisadores não há evidências suficientes para concluir que o vírus está se tornando mais ou menos letal ou contagioso. Dessa forma,as diferentes formas que estamos vendo de manifestação da COVID-19 muito provavelmente são melhores explicadas pela diversidade de imunotipos de resposta dos organismos frente a infecção, do que de variações do próprio SARS-CoV-2 especificamente. A compreensão de como essas respostas e desfecho clínico se apresentam, bem como o rastreio dessas novas mutações e o quanto elas podem impactar no curso da infecção, são informações cruciais para o desenvolvimento de medicamentos e vacinas.

Sistema imune e COVID : novos achados

 Desde que o SARS-CoV-2 foi identificado, pesquisadores procuram  entender se o sistema imune causa mais mal do que bem durante a fase aguda da COVID-19. O mais recente estudo realizado por pesquisadores do Instituto La Jolla de Imunologia indicam  que o sistema imune tem ação benéfica.

O estudo, publicado em 16 setembro de 2020 na revista Cell, confirma que múltiplas camadas de resposta imune específica a vírus são importantes para o controle durante a fase aguda da infecção e reduz a severidade da COVID-19. São fortes as evidências que indicam um papel muito mais expressivo  para as células T do que os anticorpos. Uma resposta imunológica fraca ou desordenada, indica um desfecho pior da doença. Os resultados sugerem que as candidatas à vacina devem focar em estimular uma resposta imune ampla que inclua anticorpos, células auxiliares e células T citotóxicas para garantir uma melhor proteção imune.

Os achados podem inclusive explicar porque pacientes mais idosos de COVID-19 são muito mais vulneráveis a doença. Com o aumento da idade se reduz o reservatório de células T que podem ser ativadas contra vírus específicos e a resposta imune corporal começa a ficar menos coordenada, o que parece ser um dos fatores que fazem as pessoas mais velhas serem drasticamente mais suscetíveis para fase aguda ou fatalidade perante COVID-19.

Um dado importante : não se observaram evidências de que as células T contribuam para a tempestade de citocina (proteínas inflamatórias), o que parece ser mais mediado pelo sistema imune inato.

Quando o SARS-CoV-2 (ou qualquer outro vírus) invade o corpo, o sistema imune inato é o primeiro a entrar em cena e libera um amplo e inespecífico ataque contra os invasores. Libera ondas de moléculas sinalizadoras que estimulam a inflamação e alertam o sistema imune adaptativo para a presença de patógenos.

Com o passar do tempo, o chamado sistema adaptativo se prepara e atua com extrema precisão contra o vírus, interceptando partículas virais e matando células infectadas.

O sistema imune adaptativo consiste em três frentes: anticorpos; células T auxiliares (Th), que auxiliam as células B a preparar anticorpos protetivos; e células T citotóxicas (CTL), que procuram células infectadas pelo vírus e as eliminam.

Os pesquisadores coletaram amostras de sangue de 50 pacientes com COVID-19 e analisaram as três frentes do sistema adaptativo – anticorpos específicos para SARS-CoV-2, células T auxiliares e citotóxicas – em detalhe. 

O que a equipe descobriu, similar aos estudos prévios, foi que todos indivíduos totalmente recuperados tinham respostas mensuráveis de anticorpos, células T auxiliares e citotóxicas, enquanto a resposta imune adaptativa em pacientes com COVID-19 aguda variou mais amplamente com ausência seja de anticorpos, outras células T auxiliares ou citotóxicas, ou ainda qualquer combinação de ausência das mesmas.

Uma resposta forte de células T a SARS-CoV-2 , em particular, é preditivo para doença mais branda

O efeito foi ampliado quando os pesquisadores dividiram o conjunto de dados por idade.Pessoas com mais de 65 anos são mais propensas a ter baixa resposta de células T, e uma resposta imune menos coordenada, e portanto ter COVID-19 mais severa ou fatal . Assim, parte da grande suscetibilidade dos idosos ao COVID-19 parece ser uma resposta imune adaptativa fraca, que pode ser devido a menos células T imaturas.

As células T imaturas são células T inexperientes que ainda não encontraram seu correspondente viral e estão esperando para serem ativadas. Conforme envelhecemos, o repositório de células T imaturas acessíveis do sistema imune diminui e poucas células estão disponíveis para serem ativadas para responder a novos vírus. Isso também pode levar a resposta imune adaptativa tardia,  que é incapaz de controlar um vírus até que seja tarde demais para limitar a severidade da doença ou a magnitude da resposta é insuficiente..

Alinhados com o que outras equipes de pesquisa descobriram previamente, anticorpos aparentam não desempenhar papel importante no controle da fase aguda da COVID-19. Ao invés disso, células T e células T auxiliares particularmente estão associadas com respostas imunes protetoras.

Se a vacinação for bem-sucedida, os anticorpos induzidos pela vacina estarão prontos para interceptar o vírus quando ele bater à porta. Em contraste, em uma infecção normal o vírus começa com vantagem porque o sistema imune nunca esteve em contato com nada parecido. No momento em que o sistema imune adaptativo estiver pronto para agir durante a infecção primária, o vírus já terá se replicado dentro das células e os anticorpos não poderão alcançá-los.

Desta forma, estes achados indicam que é plausível células T serem mais importantes na resposta à  infecção natural por SARS-CoV-2, e os anticorpos mais importantes para uma vacina de COVID-19.

sexta-feira, 25 de setembro de 2020

Um futuro preocupante

Um estudo publicado no dia 3 de setembro pela Faculdade de Medicina da Universidade de Washington, nos EUA, projeta um “dezembro mortal” em 2020, capaz de elevar o número de mortos pela pandemia da covid-19 no mundo dos atuais 971 mil para até 4 milhões.

Esse crescimento corresponde à projeção do “pior cenário” possível. Este seria caracterizado pela manutenção do uso de máscaras nos moldes atuais – que em muitos países deixou de ser um uso disseminado ou mesmo obrigatório – e pelo relaxamento das medidas de distanciamento social, da maneira como vem acontecendo na maior parte do mundo.

O estudo projeta ainda outros dois cenários, nos quais a adoção de medidas sanitárias mais estritas poderiam amenizar esse “dezembro mortal”.

Importante frisar que projeções sobre a pandemia feitas por esse mesmo instituto se mostraram certeiras no passado

No melhor dos cenários, as mortes por covid-19 passariam dos atuais 971 mil para 2 milhões até o fim do ano. Para que isso acontecesse, seria necessário que o uso de máscara se tornasse “quase universal” e os governos impusessem severas regras de distanciamento social toda vez que o número de mortos chegasse a oito por milhão em seus países. A média global em 23 de setembro era de quatro por milhão. Nos EUA, na mesma data, era de 20 por milhão. No Brasil, de 21 por milhão.

Os pesquisadores apresentam ainda um terceiro cenário, classificado por eles como o “mais provável”. Nesse terceiro cenário, o número de mortes na pandemia passaria dos atuais 971 mil para 2,8 milhões até o fim de 2020. Para que isso ocorra será necessário que o uso de máscaras seja universal e “as medidas de mitigação [da transmissão do vírus] permaneçam inalteradas” – ou seja, com distanciamento social, sem abertura de praias e eventos públicos de grande concentração.

O departamento da Faculdade de Medicina da Universidade de Washington responsável por essas projeções é o mesmo que produziu os modelos usados pela Casa Branca para estimar o alcance da pandemia nos EUA, com dados que se mostraram precisos.

Riscos e oportunidades

Os autores do estudo chamam a atenção para o fato de esses três cenários representarem ao mesmo tempo uma “previsão assustadora” e um “mapa da mina para aliviar a covid-19”. Tudo depende, segundo eles, das medidas que serão tomadas por governantes e indivíduos nos próximos meses.


A diferença entre o “pior cenário” e o “melhor cenário” chega a ser de 2 milhões de vidas perdidas no total acumulado desde o início da pandemia. Em todo caso, todos esses cenários mostram que haverá um aumento significativo no número de mortos em nível mundial, o que contradiz as teses mais otimistas, segundo as quais o ciclo da pandemia estaria chegando espontaneamente ao fim.

Os autores do estudo alertam para a tentação de apostar na “imunidade de rebanho”. Essa imunidade seria atingida no momento em que a maior parte da população já tivesse sido exposta ao vírus. O “pior cenário” demonstra que o preço dessa via seria o de perder 4 milhões de vidas.

Qual o cenário para o Brasil

O estudo é apresentado por seus autores como “o primeiro com projeções globais por país”. Para cada nação, foi feita uma projeção de número de mortos, considerando cada um dos três cenários – o pior, o melhor e o mais provável.

O Brasil aparece nas projeções. O país tem registrado até 23 de setembro mais de 138 mil mortos (segundo maior número do mundo, atrás apenas dos EUA) e mais de 4,5 milhões de contaminados (atrás dos EUA e da Índia, nesta ordem).

No pior cenário, o Brasil passaria a contar 177 mil mortos em vez dos 138 mil atuais, até o fim de 2020. Se isso se confirmar, o país cairá da segunda posição que ocupa atualmente para a quinta. Na projeção do estudo, Índia, EUA, Japão e Espanha – nesta ordem – teriam um número absoluto de mortos maior que o do Brasil até o fim do ano.

No melhor cenário, o total de mortos no país passaria dos atuais 138 mil para 160 mil, ficando em terceiro lugar, atrás de Índia e EUA, nesta ordem. Já no cenário mais provável, o número total de mortos seria de 174 mil mortos, novamente atrás de Índia e EUA.

Quando adotada a conta de número de mortos por cem mil, o Brasil sai do ranking dos dez países mais letais. A lista passa a ser tomada por países de menor população, como Holanda, Espanha, Ilhas Virgens (território americano no Caribe), Japão, Suécia, Romênia, Israel, Moldávia e Montenegro, além dos EUA, que mantém presença em ambas listas, tanto de mortes percentuais quanto absolutas.



sexta-feira, 18 de setembro de 2020

Reabrir escolas em tempos de COVID


 Vários países reabriram escolas com sucesso. Mas primeiro fizeram o dever de casa. No Brasil queremos (e devemos) reabrir escolas - mas se queremos fazê-lo em segurança, também precisamos fazer o nosso dever de casa.

A condição + importante é baixa taxa de transmissão na comunidade. Ideais: 1. <5 novos casos/100.000 pessoas 2. <3% de testes RT-PCR positivos Quanto maiores essas taxas, maior o risco de aumentar ainda mais a transmissão com reabertura de escolas.

Além de baixa transmissão, outras condições:

Uso correto e consistente de máscaras O máximo possível de distanciamento social Higiene das mãos e etiqueta respiratória Limpeza e desinfecção de superfícies Capacidade de rastreamento de contato

Estratégias adicionais: ventilação (atividades ar livre), barreiras físicas, diminuir tamanho das turmas , rodizios e horários alternativos para alunos e funcionários ,disposição de sabonte e alcool gel , cuidados com refeições etc

Essas estratégias são muito importantes, mas ñ terão grande impacto se transmissão na comunidade estiver alta. Nos EUA, mesmo com todas as outras condições, escolas q reabriram fecharam rapidamente porque surtos começaram a ocorrer, com alunos e funcionários testando positivo.

A França diminuiu mais de 90% o número de casos no pico da 1a onda antes da 2a. A |Espanha 97% , o Reino Unido 88%. O Brasil nunca diminuiu os casos e óbitos significativamente.Estamos mantendo há vários meses um platô muito alto.

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Queremos reabrir escolas? Precisamos fazer nosso dever de casa. Sabemos como reduzir transmissão. Basta querer.

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quinta-feira, 17 de setembro de 2020

o dificil cálculo da taxa de transmissão do SARS Cov 2

Ter o conhecimento da taxa de propagação de um vírus ao longo de uma pandemia é essencial para a tomada de decisões. Isso é normalmente feito através do acompanhamento de um indicador, conhecido como número efetivo de reprodução da infecção (Re ou Rt). O Re é o número médio de indivíduos contagiados por cada infectado nas condições existentes em um momento determinado.

Esse indicador permite que se projete a  demanda hospitalar, o uso de medicamentos e equipamentos e medidas de contenção como quarentena e sua flexibilização. Um Re equivalente a 1 significa que cada pessoa infectada transmite a doença para mais uma pessoa. Um indicador acima desse patamar indica a necessidade de intervenções de restrição ou manutenção das medidas de isolamento. Para se adotar qualquer tipo de flexibilização, o Re deve ser inferior a 1. Países que tiveram sucesso na contenção da pandemia adotaram medidas de flexibilização com taxas de 0,7 ou 0,8.

Uma variabiliade aparentemente pequena no Re pode implicar em problemas futuros. Por exemplo, usando dados da cidade de São Paulo, em um cenário de crescimento exponencial da Covid-19, uma taxa de reprodução viral efetiva de 0,95 representaria 250 mil novos casos acumulados em um mês. Com um Re de 1,05, o número subiria para 364 mil. O Re demanda informações precisas e uma atualização constante para ser um instrumento adequado de acompanhamento da evolução da doença.

No Brasil a projeção do Re é feita levando em conta o acompanhamento hospitalar de pacientes com SRAG (Síndrome Respiratória Aguda Grave) notificados no Sivep-Gripe (Sistema de Informação da Vigilância Epidemiológica da Gripe), mantido pelo Ministério da Saúde.

É uma basebem  limitada, já que entre 80% e 90% dos casos não geram internação. Outro problema é que a plataforma Sivep-Gripe é divulgada sem regularidade. Desde março, vem sendo atualizada apenas uma ou duas vezes por mês. Os dados registrados, contudo, não refletem necessariamente a informação da internação, alta médica ou óbito do dia de sua ocorrência, mas do dia da notificação.

A defasagem média entre fato e notificação é de sete dias.Isso deve ser corrigido em seu cálculo.

Existem várias formas de calcular o Re e quanto melhor for a qualidade da base de dados, mais preciso será o resultado. O primeiro passo é estabelecer o número básico de reprodução da infecção, conhecido como R0 (R zero), que mede a infectividade de um patógeno em um ambiente no qual ninguém adquiriu imunidade a ele. O R0 do vírus Sars-CoV-2, causador da Covid-19, está entre 2,5 e 3 – o que significa que um infectado contamina, em média, duas ou três pessoas.

O R0 é calculado com base em três informações: o número de contatos que uma pessoa infectada faz com indivíduos suscetíveis, o risco de transmissão em cada contato realizado e o tempo médio em que o infectado transmite a doença. Na Covid-19, a transmissão começa cerca de dois dias antes de o doente apresentar sintomas e se prorroga por mais sete.

O número efetivo de reprodução, o Re, é o R0 exposto às condições reais de evolução da doença. Portanto, muda constantemente refletindo a interação da sociedade com o agente infecioso. Pessoas que entram em contato com o agente, no caso o patógeno Sars-CoV-2, e desenvolvem imunidade, passam a não mais fazer parte do cálculo de possíveis novos casos. No futuro, o surgimento de uma vacina e sua aplicação em massa aumentará o total de imunes e, provavelmente, irá encolher o Re para um número abaixo de 1.

Em boa parte da Europa e da Ásia e em diversos estados norte-americanos, o Re é calculado olhando a situação presente. Testes regulares detectam a quantidade de pessoas que já foram expostas ao novo coronavírus e se tornaram imunes, quantas desenvolveram Covid-19 e quantas são assintomáticas. Dessa forma, o indicador reflete melhor a realidade.

O atraso nas notificações e a ausência de testagem em massa, como verificados no Brasil, obrigam os especialistas a recorrerem a algo que denominam nowcasting, a projeção do presente. Para isso, resgatam dados do passado para tentar entender o que está ocorrendo. É o que faz o Observatório Covid-19 BR, com os números do Sivep-Gripe. Outra instituição que acompanha o Re da Covid-19 no Brasil é o Imperial College, de Londres.


quarta-feira, 16 de setembro de 2020

Um novo alvo para o tratamento do COVID


 

Uma molécula conhecida como ACE2 atua como a porta de entrada nas células para o SARS Cov2.Ela está presente em várias células do corpo mas em especial no pulmão.Esse conhecimento tem sido alvo de tentativas de tratamentos para controle da infecção-CoV-2

Pesquisadores da University of California San Diego School of Medicine acabam de publicar na revista "Cell" a descoberta que o SARS-CoV-2 não consegue se fixar na ACE2 sem um carboidrato chamado de sulfato de heparan, também encontrado na superficie de células pulmonares.

O estudo possibilita um potencial novo alvo para a prevenção e tratamento do COVID-19.

Os pesquisadores demonstraram em laboratório duas abordagens que podem reduzir a habilidade do SARS-CoV-2 em infectar células em cultura em aproximadamente 80 a 90% : 1) remover o sulfato de heparan com enzimas ou 2) usar heparina como isca para dirigir o vírus para longe das células humanas. A heparina , um tipo de sulfato de heparan , já é uma medicação amplamente usada para prevenção e tratamento de problemas de coagulação.

Os achados ainda não podem ser levados como uma proposta terapêutica em pessoas.O próximo passo é testar em modelos animais Os cientistas da UC San Diego também estão explorando o papel do microbioma humano, incluindo bactérias que vivem em nosso organismo,que podem desempenhar um papel em alterar o sulfato de heparan.


domingo, 13 de setembro de 2020

Imunidade ao COVID : onde estamos ?


 

A imunidade de rebanho é atingida quando uma pessoa infectada numa população gera menos (transmite) que um caso secundário em média o que corresponde a um número de reprodução efetivo R ( número de pessoas infectadas a partir de um caso) menor do que 1 , na ausência de intervenções.

Numa população na qual individuos se misturam homogeneamente e são igualmente susceptiveis e contagiosos utiliza-se a equação  R = (1 − pC)(1 − pIR0 , onde pC é a redução relativa na transmissão por intervenções não farmacêuticas; pI é a proporção de individuos imunes; e R0 é o numero de reprodução na ausência de medidas de controle. R0 pode variar através da população com o tempo, dependendo da natureza e numero de contatos entre os individuos e fatores ambientais. Na ausência de medidas de controle (pC = 0), a condição para imunidade de rebanho (R < 1, onde R = (1 − pI)R0) é portanto atingida qundo a proporção de individuos imunes atinge pI = 1 – 1/R0.

Para o SARS-CoV-2, se estima que o R0 esteja entre 2.5–4, sem padrão geográfico. Para R0 = 3, como na França1, o limite para a imunidade de rebanho é portanto esperada requerer  67% de imunidade na população. Tambem segue a equação que , na ausência da imunidade de rebanho, a intensidade das medidas de distanciamento social necessárias para controlar a transmissão diminui enquanto a imunidade na população cresce. Por exemplo, para conter uma transmissão de R0 = 3, esta precisa ser reduzida por 67%  se a população é totalmente susceptivel, mas por 50% se um terço da população já está contaminada.

Existem situações onde a imunidade de rebanho podem ser atingidas antes da população atingir pI = 1 − 1/R0.Exemplo : se alguns individuos saõ mais prováveis de serem infectados e transmitir porque têm mais contatos, estes super transmissores irão sendo infectados primeiro. Como resultado, a população susceptivel se "livra" desses super-spreaders e a transmissão cai. Entretanto , permanece dificil quantificar o impacto deste fenômeno no contexto do COVID-19.

Para R0 = 3,pesquisadores têm mostrado que se olharmos para padrões de contato por idade (por exemplo, individuos >80  anos tem menos contato do que aqueles com 20–40 anos), o nivel de imunidade de rebanho cai para 66.7% a 62.5%.Se assumirmos que o numero de contatos varia substancialmente entre individuos a imuidade de rebanho pode ser atingida com 50% da população imune. Este cenário , entretanto , parte da fórmula pI = 1 − 1/R0  só seria observado se o mesmo perfil de individuos fossem super transmissores.

Outro fator que pode afetar a imunidade de rebanho é o papel das crianças na transmissão. Relatos iniciais mostraram que as crianças,especialmente as menores do que 10 anos,podem ser menos susceptíveis e contagiosas que adultos.Então esse grupo etário terai pouca importância na formação da imunidade de rebanho.

A imunidade da população tem sido mensurada através de inquéritos sorológicos pesquisando a imunidade humoral (anticorpos). Pesquisas em países afetados pela primeira onda da pandemia como a Espanha e Itália mostraram prevalência de anticorpos que variou entre 1 e 10%, com picos de 10–15% em áreas urbanas.

Alguns especialistas augumentam que a imunidade humoral não reflete o amplo espectro da imunidade protetora contra o SARS-CoV-2. Estudos mostram a imunidade mediada pelas células T tem sido documentada em pacientes com ausência de resposta humoral.

Outro fator desconhecido é se uma imunidade pré existente a outros coronavírus poderia desencadear algum tipo de reação cruzada.

Levando em conta as considerações acima , é pouco provável que a disseminação do SARS-CoV-2 possa parar naturalmente antes que no minimo 50% da população tenha se tornado imune.Outra questão é se uma vez atingida estes 50% , e não conhecendo o tempo que esta imunidade permanece , seria necessário novas exposições ao vírus até se atingir uma imunidade robusta.

Nas pandemia de influenza, a imunidade de rebanho é geralmente atingida após 2 ou 3 ondas epidêmicas (sazonais) e com a ajuda da imunização. Para o COVID-19, com indice de fatalidade de 0.3–1.3%, o custo para se atingir imunidade de rebanho natural seria muito alto na ausência de medidas terapêuticas eficazes. Assumindo uma otimista imunidade de 50% para países como França e USA, o numero de mortes seria , respectivamente de 100,000–450,000 e 500,000–2,100,000 de pessoas.

Uma vacina efetiva é o modo mais seguro para se atingir a imunidade protetora


a corrida pela vacina


 

Vacinas buscam atingir a idéia de imunidade de rebanho, um tipo de fortaleza biológica na qual a ampla maioria da população é protegida contra a infecção.

Uma maneira de se atingir esta meta é através da infecção natural, que envolve pacientes suficientes que serão infectados e recuperados sem sérias consequências.Esta é uma estratégia arriscada pois não se pode prever quanto tempo isso demoraria para ocorrer e durante este tempo o vírus manteria seu caminho de infecção e mortalidade.

As vacinas têm sido a essência científica para se atingir a imunidade de modo mais seguro. Desde que Edward Jenner, nos anos 1790s, descobriu que expor pessoas a pequenas quantidades do vírus da varíola poderia ocorrer a imunidade , essa técnica vem se aprimorando. Hoje , as companhias farmacêuticas e de biotecnologia estão testando mais de 100 vacinas candidatas a combater a COVID-19. Bilhões de dólares estão sendo empregados num esforço global que só encontra precedente na corrida da vacina contra a póliomielite nos anos 1950s. 

Pouco tempo após os cientistas terem isolado o novo coronavirus, equipes chineses já estavam testando 10 potenciais vacinas. Projetos ambiciosos estão em andamento como a Operation Warp Speed , liderada pelos Estados Unidos , que prometem entregar 300 milhões de doses de uma vacina em Janeiro de 2021; empresas como Moderna, AstraZeneca, Pfizer, Sanofi and Johnson & Johnson já têm seus modelos.

Porém um intenso movimento politico está crescendo na corrida pela vacina . Isso pode implicar em riscos de segurança principalmente uma vez que os estudos de fase 3 são essenciais na sua realização. Em Agosto a Russia anunciou que seu ministério da saúde tinha aprovado a vacina chamada de Sputinik que ainda estava em teste de fase 2.Toda a comunidade científica considerou muito prematura essa noticia. O exemplo de que todas as fases do estudo têm que seguir rigorosos controles foi dado recentemente quando a Astra Zêneca interrompeu temporariamente seus estudos por causa de um efeito colateral em um dos participantes.

Desenvolver uma vacina para uma nova doença infecciosa é uma aposta sempre; já estamos vivendo 40 anos da pandemia do HIV e nenhuma vacina se mostrou efetiva até agora. O SARS-CoV-2 é muito novo para a ciência que ainda não está claro se o nosso organismo irá realmente conseguir se proteger da infecção.

A urgência de uma pandemia submete os médicos a fazer hipóteses de formação de imunidade que não tem um tempo definido de duração e de intensidade. Alguns experts afirmam que , no minimo , uma vacina pode minimizar os impactos da doença mais do que levar a uma imunidade esterelizante (ou seja , duradoura)

Um outro desafio : apenas uma vacina pode não será suficiente. Da perspectiva da produção e distribuição, imunizar a população mundial irá requerer que diversas vacinas sejam somadas nesse intento.Como um problema de ordem universal nenhuma companhia tem a capacidade de absorver esse mercado.

Mesmo com multiplas vacinas , não será facil garantir que estas cheguem ás pessoas certas no momento certo. Quase todas as candidatas vão necessitar de uma segunda dose , algumas precisam ser mantidas em refrigeração.

Outra grande dúvida ; como será feita a distribuição das doses , quais pessoas terão prioridades ? Por mais que se produzam quantias altas de doses elas não serão suficientes para atingir as pessoas num primeiro momento de modo geral. As autoridades em saúde irão ter que tomar decisões sobre quem terá prioridade baseando-se , esperamos , em principios de risco e utilidade social

Um exemplo que mostra a complexidade das decisões : até 40% da população dos Estados Unidos se qualificam como grupos de risco : têm condições de base de saúde que as colocam como prioridade

Pesquisadores da CUNY Graduate School of Public Health and Health Policy usaram uma simulação de computador para calcular que se 75% da população mundial fosse vacinada, a vacina teria que ter uma efetividade de 70%. Se somente 60% fosse vacinada, a efetividade sobe para 80%.

Os desafios de atingir uma vacinação universal também encontra desafios nacionalistas : varios países estão investigando suas próprias vacinas e já manifestaram que darão prioridade aos seus cidadãos.Países de pouco recursos serão alijados , a não ser que haja uma comoção mundial , do processo inicial de imunização.

Outra argumentação bastante válida para o nosso tempo é a negativa de muitas pessoas em se vacinarem. Um terço dos americanos já demonstraram vontade em não se vacinar.Mais um obstáculo na busca de uma vacinação mundial.


quarta-feira, 9 de setembro de 2020

IgA e COVID

 Estudos de prevalência da infecção pelo SARS Cov 2 têm mostrado resultados diversos . Uma pesquisa feita na Espanha mostrou que uma pequena parcela da população tinha anticorpos a despeito do país ter enfrentado uma epidemia importante

Resposta imune variável também tem sido vista de acordo com a severidade dos sintomas . Quando pesquisas especificas de células T são realizadas normalmente seus marcadores excedem o nível de Igg detectado.

Tais resultados discordantes podem ter implicações epidemiológicas que definem a resposta imunológica e a imunidade adquirida por uma comunidade 

A precisão de um ensaio demanda uma sensibilidade suficiente para , confiavelmente , detectar respostas de anticorpos nas mais diversas situações.

A escolha de um alvo (antígeno) é critica, sendo a glicoproteína spike preferida por oferecer detecção superior que outras estruturas virais (nucleocapsídeo).

Existem 24 testes sorológicos aprovados pelo FDA. 6 utilizam apenas o nucleocapsídeo.

Na pandemia os testes têm sido avaliados , na maioria das vezes , em pacientes que tiveram sintomas.Isso implica que precisamos conhecer o comportamento dos anticorpos em pessoas com poucos sintomas ou assintomáticas. Outros problemas que podem concorrer para resultados dúbios : idade , sexo ,etnia , tempo de coleta etc.

A performance do teste também é afetada pela escolha do anticorpo . No momento a maioria utiliza anticorpos IgM e IgG. Mas os anticorpos IgA também desempenham um papel importante na resposta imune das infecções respiratórias e são relevantes no COVID , principalmente em pessoas assintomáticas.

 O SARS-CoV-2 entra nas células interagindo co proteínas expressas no trato respiratório , intestinal e na córnea. A IgA é a imunoglobulina predominante nessas mucosas e sua resposta é neutralizante para os mais diversos tipos de patógenos respiratórios. Anticorpos IgA especificos contra o SARS-CoV-2 têm sido detectados no soro , saliva e leite materno.Além disso , podem ser detectados antes do surgimento do IgG e do IgM e podem persistir por no minimo 38 dias.Uma revisão do Cochrane mostrou que sorologia baseada no IgA teve maior sensibilidade do que outros métodos.


terça-feira, 8 de setembro de 2020

o custo de uma tragédia

O presidente do Brasil busca se eximir de qualquer responsabilidade pelo desempenho do país no combate à covid-19. Para isso, estrutura sua narrativa a partir de quatro ideias centrais :

1. Negacionismo quanto à gravidade da pandemia (chamada pelo presidente de “gripezinha”)

2. Inevitabilidade das mortes e de alastramento do vírus: “é como uma chuva, vai atingir você”

3. Pretensa atribuição exclusiva de prefeitos e governadores no enfrentamento da crise sanitária

4. A não-necessidade de paralisação econômica, dada a suposta existência da cura para a doença (cloroquina).

O negacionismo ignora a facilidade de transmissão do vírus, sua taxa de mortalidade e mesmo a possibilidade de sequelas mais duradouras da doença. A maneira de demonstrar isso foi a participação do presidente em manifestações políticas, provocando aglomerações com seus passeios por Brasília, apertando as mãos de apoiadores e se recusando a usar máscara numclaro desrespeito a medidas de contenção, como o isolamento social. Chegou a dizer que os governadores e prefeitos queriam instalar uma ditadura com suas quarentenas.

A segunda ideia (fatalismo), que desconsidera os resultados melhores de outros países na contenção do vírus, concretizou-se não apenas nas suas declarações, mas também em seus vetos (depois derrubados pelo Congresso) a leis que os parlamentares aprovaram. O presidente foi no caminho contrário em medidas tanto para garantir recursos ao combate da pandemia entre indígenas, quilombolas e outras comunidades tradicionais, quanto para tornar obrigatório o uso de máscara em presídios, templos religiosos e outros estabelecimentos.

A terceira ideia (impossibilidade de agir), que busca atribuir exclusivamente a governadores e prefeitos a obrigação de resolver a crise sanitária, parte de uma interpretação distorcida de uma decisão do Supremo Tribunal Federal. Em abril, os ministros definiram que, pela Constituição, estados e municípios têm poder de impor medidas sanitárias que considerarem necessárias em seu território e não podem ser desautorizados pelo governo federal.

A decisão, no entanto, não isentou o governo da responsabilidade de promover políticas nacionais para o enfrentamento da crise sanitária. 

Por fim, a quarta ideia (existência da cura), que busca amparar a volta à normalidade, transforma a cloroquina e seu derivado hidroxicloroquina — remédios que não têm o aval de estudos criteriosos para o tratamento da covid-19 — na maior proposta do presidente para o enfrentamento da pandemia na área sanitária.



Islândia : anticorpos e mortalidade



A discussão permanece sobre o tempo de permanência de anticorpos após a infecção pelo SARS Cov2. Alguns dados atestam a relação inversa entre a persistência da defesa e a severidade da doença ( mais grave - mais duradoura a resposta) com a sugestão que infecções assintomáticas poderiam ocorrer sem soroconversão

Estudos tambem demonstraram que os títulos de anticorpos tendem a cair após infecções leves levantando a possibilidade que a imunidade humoral pode ser de vida curta.

 Um trabalho publicado recentemente no JAMA realizado por Stefansson e colegas mostrou o impacto e implicações dos anticorpos em nível populacional, captando as nuances de prevalência, risco de mortalidade e duração da imunidade.

O estudo foi feito na Islândia, onde 15% da população foi testada por PCR e por anticorpos. Ele envolveu cerca de 30 mil pessoas, incluindo pacientes hospitalizados e da comunidade além de contactuantes . Para os testes de anticorpos foram utilizados dois ensaios altamente sensíveis. Stefansson monitorou os níveis de anticorpos por 4 meses.

Os dados mostraram que aproximadamente 56% dos soropositivos tinham tambem um PCR confirmado. Um terço das infecções foram detectadas em pessoas assintomáticas. Esse cruzamente de informações possibilitou avaliar um risco de mortalidade de 0.3% na Islândia. A mais importante observação foi de que os anticorpos permaneceram estáveis por 4 meses. Diferente dos estudos anteriores este mostrou estabilidade da imunidade humoral.

Se os anticorpos que persistem conferem proteção permanece ainda indefinido.

 

Carga viral em sintomáticos e assintomáticos com COVID

 A maior parte dos relatos sobre o SARS Cov2 sugerem que pacientes assintomáticos podem transmitir o vírus. Um estudo feito na Coréia do Sul comparou a carga viral e o tempo para clearance(tempo em que o paciente passa a ter o PCR negativo) entre sintomáticos e assintomáticos 

Foram avaliados 303 infectados em Daegu , isolados em um alojamento para tratamento , e uma série de cargas virais foram estabelecidas . A população estudada tinha em média 25 anos e somente 12 (3,9%) tinham comorbidades. A maioria dos pacientes eram sintomáticos no momento da apresentação (63,7%).Dos assintomáticos (110 no inicio) , 21 (19%) desenvolveram sintomas.Os investigadores compararam a carga viral entre os que tinham e os que não tinham sintomas e não encontraram diferença.Além disso também não houve diferença no clearance viral : média de 17 dias (assintomáticos) e 19,5 dias (sintomáticos).

A Vacina da Russia

 



No dia 11 de agosto de 2020, a Russia se tornou o primeiro país a aprovar uma vacina contra o SARS-CoV-2.

A vacina é baseada em dois vetores de adenovírus e foi desenvolvida pela Gamaleya National Center of Epidemiology and Microbiology de Moscou. Sua aprovação foi anunciada pelo presidente Vladimir Putin. A comunidade científica foi pega de surpresa considerando muito prematura a sua propagação : ela não tinha iniciado a fase 3 de testes e nenhum resultado das fases anteriores também tinham sido apresentados.

A revista The Lancet acaba de publicar os estudos de fase 1 e 2. A vacina induziu uma forte produção de anticorpos em todos os 76 pacientes.

Para as agências reguladoras , como a FDA, entretanto ,dados destas fase apenas não saõ adequados para a aprovação de uma vacina.

A vacina é chamada de Sputnik V, uma alusão ao programa espacial soviético . Uma produção em massa é esperada para começar em Setembro na Russia, que tem cerca de um milhão de casos de COVID-19.

A vacina é financiada pelo Russian Direct Investment Fund (RDIF) . Em Agosto o país relata ter iniciado um amplo estudo com 40 mil voluntários. Outros países também estão arrolados para esta fase , entre eles o Brasil.

De acordo com a OMS, em 28 de Agosto , nove vacinas estavam em estudo nos últimos estágios das fases de testes. Esta incluem vacinas de vetores de adenovírus, vacinas de mRNA e de vírus inativados. 

Se a Sputnik não confirmar bons resultados isto pode afetar a percepção do publico sobre a segurança das vacinas. Além disso , um produto inefetivo pode na verdade piorar a pandemia—aqueles que receberam a vacina podem parar de se comportar preventivamente e contrair o SARS-CoV-2.

interpretando o indice de transmissibilidade

 Um dos números básicos calculados numa epidemia é o R0, que informa o potencial da epidemia se espalhar em uma população que só tenha pessoas suscetíveis.

O R0 expressa quantas novas infecções o primeiro caso da doença pode causar, em média.

Esse número é uma característica da doença em si, que depende do potencial infectante de um patógeno, da taxa de contatos na população e da duração da infecção, principalmente. Esse numero só pode ser calculado com precisão quando a epidemia já se resolveu.

Cada doença tem um R0 característico. Por exemplo, o sarampo tem um R0 entre 12 e 15 (até 18),uma das doenças mais infectantes que se tem conhecimento. Com isso ,para se controlar o sarampo, é necessário que ~95% da população seja vacinada contra ele. Neste caso, a maioria dos contatos envolverá pelo menos uma pessoa vacinada portanto, não resultará em uma transmissão.

A vacinação é uma das maneiras de diminuir o número de suscetíveis de uma população. Para cada valor de R0 há um proporção da população que deve ser vacinada para que o R efetivo fique abaixo de um e, assim, se evite que a doença espalhe.

Então uma pequena minoria que se recuse a tomar vacina pode causar um surto epidêmico. Ano passado houve queda na cobertura vacinal de sarampo no país e tivemos surtos . É por isso que vacinação não pode ser uma escolha individual, pois afeta o coletivo.

O R0 do Sars-Cov2 é provavelmente algo entre 2 e 6. Usando esses números, quando houver vacina teremos que imunizar entre 50% e 74% da população. Mas como ainda não temos vacina para ele, a contenção da epidemia depende unicamente de outras medidas



Irresponsabilidade social : o legado da pandemia

 


Estamos observando com frequência cada vez maior o descaso de uma boa parte da população com as medidas de controle do novo coronavírus. Registros de praias lotadas , aglomeramento em bares , não uso de máscaras etc são um reflexo da irresponsabilidade social motivada por diversos fatores o que apenas protela e pontencializa a presença da pandemia.

Entre 7 e 16 de Agosto, cerca de 500.000 motociclistas e entusiastas foram para a cidade de Sturgis, na Dakota do Sul , Estados |Unidos, para seu encontro de rally anual. O que se observou foram grandes aglomeramentos de pessoas nas ruas  , bares etc, uso mínimo de máscaras e absoluto não cumprimento do distanciamento social . Obviamente que essa conjunção de  circunstâncias poderia resultar num alto grau de contaminação pelo SARS COv 2.

Um estudo detalhado acaba de ser publicado analisando as consequências do evento . Foram computados dados de mobilidade no local , movimento de pedestres e ocupação de bares e restaurantes , frequência nas lojas e locais de entretenimento.Também se avaliou o comportamento dos residentes como o período de permanência domiciliar.

Usando dados do CDC, em 2 de Setembro, um mês após o Rally, casos de COVID-19 aumentaram por aproximadamente 6 para 7 casos por 1000 pessoas da população local.

A estimativa mostra que após o evento de Sturgis, os locais que contribuíram para o maior fluxo de pessoas que foram a Sturgis tiveram de 7.0 a 12.5 % de aumento do COVID-19 ,comparando com localidades que não tiveram moradores que se deslocaram pra lá. 

É possível concluir que o Sturgis Motorcycle Rally gerou custos para a saúde pública de aproximadamente$12.2 bilhões de dólares. O correspondente a 250 mil novas infecções.

sexta-feira, 4 de setembro de 2020

SARS Cov 2 no coração


Talvez já possamos afirmar que a COVD 19 é também uma doença cardíaca.

Quando o SARS-CoV-2 foi colocado em contato com células cardíacas humanas em laboratório, as longas fibras musculares que mantêm o batimento cardíaco foram fragmentadas em pequenos pedaços, criando um enorme alarme entre os cientistas da San Francisco- Gladstone Institutes, que estudavam autópsias de pacientes falecidos por complicações do COVID 19. 

Esta experiência pode explicar porque algumas pessoas ainda sintam falta de ar após a infecção desaparecer e implica em questionamentos sobre a evolução a longo prazo da doença.

 Bruce Conklin, um co autor do estudo, disse que a "carnificina" vista nestas células humanas nunca foi antes descrita em outras patologias.  Segundo ele , " parece que as fibras tinham sido fatiadas cirurgicamente "

Outro achado misterioso foram verdadeiros "buracos negros" observados nas células onde deveria haver a presença do DNA no nucleo , deixando uma aparência de uma concha vazia.

Os cientistas avaliaram 3 tipos de células presentes no coração humano: cardiomiócitos, fibroblastos cardíacos e células endoteliais. Somente os cardiomiócitos — células musculares — mostraram sinais de infecção viral que se disseminava para para as células musculares adjacentes.

O dano celular e do DNA causado pela infecção poderia explicar os achados precoces de prejuízo cardíaco assim como os relatos de astenia em pacientes que demoram para se recuperar de quadros leves ou moderados de COVID 19.

As consequências desse prejuízo celular a longo prazo´são preocupantes. Células cardíacas , diferentemente de hepáticas , não se regeneram. Estudos na Alemanha mostraram que em 39 autópsias de idosos e 100 exames de ressonância magnética de pacientes jovens que tiveram infecção leve por COVID , foram observadas alterações cardíacas. 


Cautela na intepretação dos números do COVID 19

Nós tivemos menos mortes por COVID 19 no Brasil em agosto de 2020 em comparação ao mês anterior. Em julho o país registrou 32.912 óbitos, agosto totalizou 28.947. A redução foi de 12%.

A média móvel de sete dias também registrou queda, de 11%. Nesse caso, a comparação é entre o dado divulgado na segunda-feira (31) e o de 17 de agosto. Foram 971 mortes na data anterior contra 866 no dado mais recente. A média móvel é obtida quando se soma o resultado dos últimos sete dias e se divide por sete, e é usada para nivelar discrepâncias nos registros de óbitos, que costumam cair nos fins de semana.

Porém , as reduções nos dados não são homogêneas quando avaliamos diferentes estados e cidades. Por exemplo ,tomando-se a comparação entre a média móvel de 31 de agosto com a de 17 do mesmo mês, o Rio Grande do Sul apresentou uma redução de 20% nos óbitos e o Rio de Janeiro, uma alta de 64%.

Na quarta-feira (02 de setembro), o Imperial College, centro britânico de análise de epidemias, divulgou que a taxa de transmissão (Rt) do Brasil é a menor desde o final de abril. De acordo com a instituição, o índice é de 0,94, ou seja, cada 100 contaminados transmitem o novo coronavírus para outros 94. Estes 94 passam para outros 88, em um movimento de declínio do contágio.

Esses resultados acontecem em meio à reabertura do comércio e à retomada de atividades presenciais por todo o país.Isso vem sendo acompanhado por uma queda cada vez mais acentuada à adesão ao isolamento social.Pesquisa do Datafolha publicada em 18 de agosto mostra que apenas 8% dos entrevistados seguiam realizando isolamento total. Em abril, eram 16%. Outros 43% evitam sair de casa, em comparação com 53% em abril.

As estatísticas mais recentes que mostram diminuição no número de mortes e na média móvel do país, no entanto, ainda não são suficientes para classificar o quadro como de queda consolidada.

Na infectologia analisamos que se os números continuarem caindo é possível que o país saia de uma fase de epidemia para uma fase endêmica. Isso representa ter um número menor de casos, mas constantes e que podem manter os riscos de termos doentes graves nas UTIs.

É importante enfatizar que temos muita gente suscetível , ou seja , pessoas que não foram infectadas e portanto não´seria surpresa se tivermos ascendência dos casos novamente. No Rio de Janeiro houve um um pico grande entre maio e junho, em julho começou a cair, mas as mortes voltaram a crescer de modo preocupante agora.

Em alguns estados podemos ainda ter novas ondas e ter que nos preocupar de novo com aumento de mortalidade e maior rigidez no distanciamento. Se novas ondas aparecerem, significa que teremos que conviver com essas idas e vindas por mais tempo, até termos a vacina.

Uma explicação para a queda dos casos em São Paulo , como exemplo,seria o surgimento de “bolhas de proteção”, em que se esgotam as redes de contágio. Nesse modelo, pessoas que ainda não foram contaminadas acabam protegidas por uma barreira de indivíduos que já estão imunes. O distanciamento social também contribui para esse fenômeno.

Em julho de 2020, um estudo publicado pela revista científica americana Science constatou que as medidas de isolamento social nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro reduziram pela metade a transmissão do vírus. O levantamento da Universidade de Oxford, da USP (Universidade de São Paulo) e da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) apontou que a taxa de transmissão das duas cidades era maior que 3 antes do isolamento e depois caiu para um intervalo entre 1 e 1,6.

quinta-feira, 3 de setembro de 2020

Uma nova vacina

 A Novavax é uma nova vacina para o COVID 19.

É bem diferente das outras em testes, é a primeira vacina proteica que mostra os resultados em animais e fase 1 de humanos usando uma tecnologia moderna de producão da proteína alvo em células de inseto!

Ela usa uma proteína purificada, produzida em células de inseto, utilizando um baculovirus geneticamente modificado.( O baculovirus carrega uma sequencia da proteína S do virus para dentro das células de inseto e então a proteína produzida é purificada.)

A vantagem dessa tecnologia é usar o sistema de insetos : é mais rápido e fácil do que usar células de mamíferos.A proteína já fica também pronta se pra usar na vacina.

Outra vantagem é queimar etapas. Não é necessário purificar nada, trabalha - se só com sequencias genéticas e as nossas células fazem o trabalho por nós.

Vacinas de proteína ou de organismos inativos naõ costumam ser muito imunogenicas sozinhas, entao precisam de adjuvantes. Adjuvantes são substancias que são colocadas na formulação vacinal, para provocar uma inflamação. É na inflamaçãoa que chegam as células do sistema imune para recrutar e obter uma boa resposta de anticorpos ou células T. Ou de preferencia, ambas! Se o corpo nao perceber sinais de perigo, nao tem reação inflamatória. O adjuvante serve pra isso. A Novavax usou um adjuvante.

Em testes com animais ( babuinos) a resposta de anticorpos neutralizantes (aqueles que realmente protegem) foi bem impressionante, 8 vezes maior do que a de soro de convalescente.

Testaram 131 pessoas, em esquema de duas doses. O adjuvante também funcionou super bem , aumentou tanto a resposta de anticorpos neutralizantes, que dá pra usar uma dose bem pequena da vacina. Bom para producao.

A quantidade de anticorpos neutralizantes observada após a segunda dose foi 4 x maior nos vacinados, comparado a soro de convalescentes. 16 pessoas foram selecionadas para contagem de células T, e apresentaram grandes quantidade de TCD4, com mais resposta Th1, aquela que queremos


A volta às aulas

Dos 193 países do mundo, 134 suspenderam as aulas durante a pandemia da covid-19. Algo absolutamente inédito na história da humanidade. Até agosto de 2020, mais de 1 bilhão de crianças e jovens ficaram longe da escola, de acordo com a Unicef, a agência das Nações Unidas para infância.

No inicio do do segundo semestre, 105 desses 134 países –78% do total – tentaram a retomada das aulas. 59 começaram essa jornada no final de agosto, mesmo que diante do risco de uma segunda onda de contaminação.

No Brasil, governos estaduais estudam os melhores protocolos para a volta às aulas presenciais.

Porém, diante do ineditismo desse processo complexo da pandemia várias questões ainda não podem ser completamente respondidas.

A Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância) publicou no dia 24 de agosto um material simples e didático, com dados e parâmetros para auxiliar nas decisões a serem tomadas por autoridades políticas, sanitárias e educacionais.

Ao pensar em reabrir escolas, as autoridades devem levar em conta os benefícios e os riscos para a educação, para a saúde pública e para a realidade socioeconômica no contexto específico. A defesa do interesse de cada criança deve estar no centro das decisões tomadas, usando para isso as melhores evidências disponíveis. Entretanto, a forma como essa retomada se dará vai variar de escola para escola”, diz o documento da Unicef.

Uma coisa muito relevante a destacar é que qualquer política de retomada das aulas só será segura e efetiva se estiver em sintonia com as demais políticas sanitárias adotadas em cada país. Não adianta a criança ir para uma escola onde vigorem protocolos rigorosos de distanciamento se, ao voltar para casa, o contexto é de aglomeração, de contato descontrolado com diversas pessoas e de descuido no uso de máscaras e com a higiene das mãos.

As sugestões vão desde ideias simples – como realizar aulas ao ar livre, em vez de usar espaços fechados – até alterar características físicas das escolas, quando necessário e possível.

Nas escolas brasileiras já ocorrem debates como a diminuição das turmas e a rotatividade dos alunos, para garantir o distanciamento entre as carteiras e prevenir aglomerações.

Alguns tópicos são problemas universais como a dificuldade em garantir as condições de higiene nos banheiros de uso coletivo. A pandemia reforçou a necessidade de que as escolas tenham sabonete disponível em quantidade suficiente nos sanitários o tempo todo, o que é difícil encontrar, mesmo em escolas de países desenvolvidos.

Um dos pontos que o documento realça é a importância de prestar atenção à carga emocional que essa situação excepcional traz aos alunos que regressam às aulas.

É preciso prestar apoio psicológico às crianças infectadas, para combater o estigma e o preconceito de colegas de classe durante o período de afastamento.

É importante, diz o documento da Unicef, que as crianças saibam que não há nada de errado em sentir medo, angústia e ansiedade em relação a tantas e tão grandes mudanças nesse período.

Para facilitar a detecção desses casos, a agência recomenda que as escolas mantenham comitês de pais e professores, que sejam capazes de facilitar o contato entre o que acontece em casa e na escola.

 A Unicef antecipa que muitos estudantes precisarão de ajuda suplementar nos próximos meses, dado o caráter excepcional do momento. Nesses casos, são recomendadas iniciativas como retrospectivas de conteúdo, abertura de horários suplementares e lições de casa em maior quantidade e frequência.