A autoestima se tornou um mercado.
O valor de si, que antes pertencia ao campo do íntimo, foi
capturado pela lógica da performance. O sujeito contemporâneo não apenas vive,
mas se avalia. Mede-se em produtividade, relevância, beleza, engajamento,
competência — e cada uma dessas métricas funciona como um espelho fragmentado.
O que antes era experiência afetiva tornou-se capital simbólico. Amar a si
mesmo deixou de ser um exercício ético e virou obrigação econômica.
Pierre Bourdieu já advertia que todo campo social produz
suas próprias formas de valor e distinção. O corpo, a aparência, o modo de
falar, o estilo de vida — tudo pode ser convertido em capital. No capitalismo
emocional, até a subjetividade se torna investimento. O sujeito aprende a gerir
a própria imagem como ativo: seu valor não está no que é, mas no quanto
consegue se tornar desejável. A autoestima, nesse contexto, é função da
visibilidade. Quanto mais visto, mais válido.
Axel Honneth, ao pensar o reconhecimento como necessidade
humana, propõe que a identidade se constrói no espelho social — precisamos ser
reconhecidos para existir. Mas o que acontece quando o reconhecimento é mediado
por métricas digitais e performativas? A autoestima deixa de ser relação
simbólica e passa a ser contábil. O outro deixa de ser espelho e se torna
audiência,ou pior,seguidor. O sujeito se confunde com a própria vitrine,
alimentando uma economia afetiva que mede amor em curtidas e valor em
produtividade emocional.
Erich Fromm via no capitalismo tardio uma inversão perigosa:
o “ser” substituído pelo “ter”, e agora, pelo “parecer”. A autoestima,
transformada em produto, alimenta um ciclo de dependência: o sujeito consome
práticas de autoconhecimento e discursos de empoderamento, mas continua
prisioneiro da comparação. A promessa de libertação vira mais uma forma de
controle. A lógica do mercado infiltra-se até no amor-próprio, convertendo a
busca por autenticidade em mais uma estratégia de venda.
A obsessão moderna por medir o próprio valor revela,
paradoxalmente, uma crise de valor. O sujeito que precisa provar constantemente
sua importância é aquele que perdeu o contato com o próprio eixo interno. A
autoestima verdadeira não se funda em acreditar ser o melhor, mas em suportar
ser apenas. Ela é prática, não crença; gesto, não conceito. É a capacidade de
existir sem precisar transformar tudo em métrica.
Então nos cabe :
Rejeitar a comparação como critério. Nenhuma vida cabe em
ranking.
Reaprender o prazer de fazer algo sem finalidade. O valor
não precisa de prova.
Tratar o reconhecimento como eco, não como origem.
Cultivar vínculos que o vejam para além da performance.
Autoestima não é acreditar que vale muito — é não precisar
medir o quanto.
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