sábado, 15 de novembro de 2025

auto estima

 








A autoestima se tornou um mercado.

O valor de si, que antes pertencia ao campo do íntimo, foi capturado pela lógica da performance. O sujeito contemporâneo não apenas vive, mas se avalia. Mede-se em produtividade, relevância, beleza, engajamento, competência — e cada uma dessas métricas funciona como um espelho fragmentado. O que antes era experiência afetiva tornou-se capital simbólico. Amar a si mesmo deixou de ser um exercício ético e virou obrigação econômica.

Pierre Bourdieu já advertia que todo campo social produz suas próprias formas de valor e distinção. O corpo, a aparência, o modo de falar, o estilo de vida — tudo pode ser convertido em capital. No capitalismo emocional, até a subjetividade se torna investimento. O sujeito aprende a gerir a própria imagem como ativo: seu valor não está no que é, mas no quanto consegue se tornar desejável. A autoestima, nesse contexto, é função da visibilidade. Quanto mais visto, mais válido.

Axel Honneth, ao pensar o reconhecimento como necessidade humana, propõe que a identidade se constrói no espelho social — precisamos ser reconhecidos para existir. Mas o que acontece quando o reconhecimento é mediado por métricas digitais e performativas? A autoestima deixa de ser relação simbólica e passa a ser contábil. O outro deixa de ser espelho e se torna audiência,ou pior,seguidor. O sujeito se confunde com a própria vitrine, alimentando uma economia afetiva que mede amor em curtidas e valor em produtividade emocional.

Erich Fromm via no capitalismo tardio uma inversão perigosa: o “ser” substituído pelo “ter”, e agora, pelo “parecer”. A autoestima, transformada em produto, alimenta um ciclo de dependência: o sujeito consome práticas de autoconhecimento e discursos de empoderamento, mas continua prisioneiro da comparação. A promessa de libertação vira mais uma forma de controle. A lógica do mercado infiltra-se até no amor-próprio, convertendo a busca por autenticidade em mais uma estratégia de venda.

A obsessão moderna por medir o próprio valor revela, paradoxalmente, uma crise de valor. O sujeito que precisa provar constantemente sua importância é aquele que perdeu o contato com o próprio eixo interno. A autoestima verdadeira não se funda em acreditar ser o melhor, mas em suportar ser apenas. Ela é prática, não crença; gesto, não conceito. É a capacidade de existir sem precisar transformar tudo em métrica.

Então nos cabe :

Rejeitar a comparação como critério. Nenhuma vida cabe em ranking.

Reaprender o prazer de fazer algo sem finalidade. O valor não precisa de prova.

Tratar o reconhecimento como eco, não como origem.

Cultivar vínculos que o vejam para além da performance.

Autoestima não é acreditar que vale muito — é não precisar medir o quanto.

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