sábado, 16 de janeiro de 2021

Guerra de narrativas : médicos que prescrevem drogas que não têm efeitos no tratamento do COVID

Aprendemos muito com a experiência mundial no manejo do COVD quando completamos um ano de pandemia. Temos consensos , nacionais e internacionais muito bem fundamentados , sobre o que funciona no tratamento. Isso pode ser encontrado nas Diretrizes da OMS para manejo da Covid19, nas orientações do NIH (USA), nas orientações do CDC (USA), nas orientaçoes da Agência Médica Europeia (EMA). No Brasil na Sociedade Brasileira de Infectologia, Sociedade Brasileira de Pneumologia, Associação de Medicina Intensiva Brasileira.

Infelizmente , uma parcela de médicos ignora a Medicina e cria uma narrativa paralela baseando-se em artigos científicos de má qualidade,especulações , artigos de péssima qualidade  e suas próprias experiências de observação.

O discurso é muito parecido : " tenho visto resultados incríveis com o tratamento precoce da Covid19, os pacientes melhoram". Criam um mantra para subsidiar suas prescrições, negando toda a produção cuidadosa de evidências dos ensaios clínicos sólidos.É uma ilusão de óptica :

A Covid19 tem uma evolução favorável na maioria dos casos (felizmente !!), mesmos em pacientes de risco. A doença irá ser "tratada" por medicamentos sintomáticos (quando houver necessidade) ou por qualquer coisa que for dada ao paciente ( canjas , chás , dipirona etc).Para esses médicos, a sensação de ter impactado na melhora ,acaba justificando a ignorância científica. Por isso , há muito tempo ,os estudos clínicos randomizados,controlados por placebo,são um imperativo na ciência médica pois só assim é possível verificar se de fato o tratamento é efetivo e seguro.


Esses médicos contrariam a modernização da medicina dos últimos 50 anos.O seu avanço em prol de uma prescrição mais segura e eficaz.Um tratamento fundamentado na interpretação de resultados de ensaios clínicos controlados solidifica a verdadeira ciência e retira a " autoridade" das conclusões pessoais (base da famosa frase : " na minha experiência" !!)
 Além de não funcionar,o chamado "tratamento precoce" ou a "profilaxia contra o COVID" causa uma falsa sensação de proteção.O paciente acaba tendo maior risco de se infectar. Sente-se mais seguro , protegido. Relaxa nas medidas de proteção.

Existe um custo para esta infeliz prática .O governo investiu 11 milhões de reais nos kits de traatmento precoce. Prefeitos e Governadores empregam parte do orçamento em saúde para bancar esta prática absurda. Resultado : as UTIs estão lotadas de pacientes que seguiram o tratamento precoce.
O pior : há uma forte associação entre médicos e pessoas que seguem seus preceitos no tratamento precoce com uma posição anti-vacina. Boa parte destes são apoiadores do Governo Bolsonaro e de sua catástrófica gestão da pandemia no Brasil.Um governo que tem uma clara agenda anti-ciência e que nega o consenso científico contrariando as medidas mais eficazes de controle da pandemia :evitar aglomerações e uso de máscaras.
Soma-se a estes fatos a nula participação dos conselhos de medicina. Não vimos até o momento quaisquer medidas  para coibir (ou mesmo punir) esses médicos que se posicionam contra o rigor científico e que acabam sendo formadores de opinião.
Enquanto isso vemos um país se curvar diante de um vírus que soma milhares de mortos. Para a medicina , o COVID legará a pior herança : a morte da credibilidade de uma profissão.O descrédito na ciência . A vulgarização do ato médico . 



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