A pandemia causou uma polarização das sociedades em todo o
mundo, com desigualdade econômica, desconfiança em instituições centrais e
assimetrias na avaliação de risco.
Estudos mostram que a necessidade de solidariedade,no
inicio, criou diferenças no cumprimento dos conselhos das autoridades.E tudo
mudou lentamente à medida que o isolamento social prolongado levou ao cansaço,
que por sua vez levou à diminuição da confiança política e ao aumento do apoio ao
radicalismo e negacionismo.
Quando a pandemia se instalou o mundo ocidental já estava
ficando menos estável. A desigualdade econômica já era um fator de
instabilidade e estava em ascensão. Psicologicamente, a desigualdade gera
desconfiança nas instituições centrais. A crise financeira se aprofundando leva
a uma reação populista e, na era da mídia social, aqueles que desconfiam das
autoridades podem coordenar e compartilhar com mais facilidade a desinformação.
Provavelmente a pandemia criou a maior mudança de
comportamento da história mundial. Em nenhum outro momento, muitos ao mesmo
tempo fizeram a mesma coisa.E com isso começou o 1º grande ato do desdobramento
da polarização pandêmica. A semente do conflito foi o fato de existirem enormes
assimetrias no risco da doença, sobretudo relacionadas com a idade. Isso já
estava claro nos primeiros dados de Wuhan. As assimetrias no risco significam
que alguns arcarão com mais custos de redução da transmissão social (jovens e
saudáveis), enquanto outros obterão mais benefícios (idosos e doentes). Em
essência, a principio , para muitos o isolamento foi um ato de solidariedade.
Estudos recentes fornecem evidências claras de que um grande preditor de
diferenças em seguir conselhos sobre distanciamento e uso de máscaras é a
diferença individual na empatia. Outro é o senso de comunidade: identificar-se
com seu país.
No 1.º ato, a necessidade de solidariedade criou
divergências iniciais no cumprimento dos conselhos das autoridades. Apesar
disso, em geral, havia apoio da maioria em muitos países para políticas
nacionais. No entanto, isso mudou lentamente e o apoio começou a diminuir à
medida que a rápida mudança comportamental se transformou em isolamento social
prolongado impostos em todo o mundo em 2020 ( de maneira não homogênea). E,
assim, iniciou o segundo ato de polarização pandêmica.
O isolamento social acarreta custos: económicos, ao nível da
saúde mental e ao seu sentido de liberdade. Esses "custos de
conformidade" induziam à fadiga. Quando as restrições se tornaram mais
rígidas, a fadiga aumentou. Quando a necessidade de restrições ficou clara para
o público (ou seja, muitas mortes), a fadiga foi mantida sob controle. Mas o
próprio tempo também teve um efeito. O cansaço aumentou.
À medida que a fadiga progredia, ela moldava o
comportamento. A fadiga polarizou aqueles que sofreram com as imposições de
políticas de saúde , implicando em descrédito nas autoridades e aumentando sua
crença em teorias da conspiração.
2020 terminou com a chegada das vacinas.E com elas começou o
3º e último ato de polarização.
Surgiram os problemas com a hesitação vacinal .A
desinformação por parte de alguns governos (como no caso do Brasil), a
desconfiança nas autoridades, a manipulação criminosa das fake news potencializaram
a fadiga pandêmica.Não vacinados enfrentaram significativa condenação moral dos
vacinados.Psicologicamente, isso foi impulsionado por preocupações pessoais e
não sociais (ou seja, relacionadas a si mesmo e não aos outros) em relação ao
impacto da pandemia. Esta condenação foi alimentada ainda mais por políticos.A
hesitação vacinal só piorou com as condenações simplesimpostas por medidas
restritivas Estava criada uma nova clivagem sociopolítica global com base no
status de vacinação. Pesquisas mostraram que em 21 países os vacinados foram
motivados a excluir os não vacinados das relações familiares, mas não o
contrário.
Enfim : como a pandemia polarizou as sociedades?
#1 Diferentes custos/benefícios criaram diferenças na
conformidade
#2 Fadiga entre aqueles que mais sofreram criou desconfiança
e promoveu hesitação vacinal
#3 Hesitação alimentou forte raiva contra não vacinados,
aprofundando sua desconfiança
Isso tem implicações importantes:
1.
A
confiança é fundamental para resolver a pandemia, mas a pandemia corroeu esse
recurso crítico, deixando as sociedades menos preparadas para a próxima crise.
E as próximas crises já estão aí.
2.
Um
insight importante é que o gerenciamento de crises não pode ser deixado para amadores.
Ele precisa incluir,por exemplo, cientistas sociais com ampla experiência
comportamental.
3.
A
polarização é provável em qualquer crise que implique uma mudança massiva de
comportamento, como a crise climática. Precisamos pensar profundamente sobre
como evitar futuras dinâmicas semelhantes .
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