A ilusão da realidade

Quando abrimos os olhos...é o mundo real que realmente enxergamos ?
Esta tem sido uma questão filosófica há milhares de anos.No século 18 Kant opinou que nunca teríamos acesso à realidade objetiva.Recentemente a neurociência nos deu uma resposta : nós não temos a experiência do mundo na sua totalidade real pois nosso cérebro não evoluiu para tanto.
Apenas 10% da informação nossos cérebros utilizam para ver o que vem de nossos olhos.A percepção deriva não só dos 5 sentidos mas também de uma sofisticada rede infinita de neurônios que transformam no senso comum a informação.
A percepção importa pois ela apóia tudo o que pensamos , sabemos e acreditamos.Nosso mais essencial meio de entender a existência começa e termina com a percepção.A morte que todos tememos é menos a morte do corpo do que a morte da percepção.

Nosso cérebro é uma encarnação dos reflexos perceptivos de nossos ancestrais , moldados pela seleção natural , combinados e mudados com nossas culturas e crenças.
A incerteza é um problema que evoluímos para resolver.A vida é uma inerente incerteza pois está sempre em mudança , em renovação , em deteriorização.Um mundo ainda mais conectado é mais incerto e de certa forma mais angustiante para a busca de respostas.Para a busca de uma realidade.

Precisamos abraçar o poder perceptivo da dúvida e da humildade que vem com o lento entendimento dos nossos cérebros.É sobre o porque nós vemos o que fazemos e como não temos acesso a mais pura realidade, o melhor é fazer o correto.A próxima grande revolução não será tecnológica : será a revolução de como melhor ver a realidade

O amor nos torna mais espertos

O amor sempre foi associado a um estado de perda do senso de racionalidade , de se estar " cego" pela pessoa amada , de viver em um outro mundo.Existe uma certa base científica para isso : o amor tem sido correlacionado à areas de diminuição de atividade cerebrais associadas à memória , aprendizado e pensamentos abstratos.Alguns neurologistas têm encontrado uma correlação entre o amor e comportamentos irracionais e obsessivos.
Mas existe um outro lado da história.Estar amando pode potencializar a nossa cognição.O amor pode atenuar o stress crônico cerebral que repercute principalmente em uma estrutura chamada hipocampo.

Em 2013 um estudo publicado no jornal Brain Research mostrou que o sentimento melhorou a habilidade de distinção durante o período de stress.Anteriormente , em 2009 , outro trabalho demonstrou que pessoas que foram expostas a imagens que representavam o amor mostraram uma melhor habilidade criativa e lógica para resolverem quebra cabeças

Os autores de uma pesquisa  realizada em 2014 pela Review of General Psychology encontraram que pessoas românticas têm melhor habilidade para o entendimento do status mental de outros indivíduos.Desenvolvem um sentimento mais acurado de empatia.Alguns cientistas chamam esta situação de " Teoria da Mente" que é uma capacidade melhorada de imaginar as intenções , emoções e necessidades  alheias

Então se você for taxado como infantil ou "desligado" por estar apaixonado lembre-se que você pode ser a pessoa mais esperta no mundo

Baleia azul

Um novo pânico moral atravessa o mundo por conta de um culto suicida originário da Rússia e que envolve adolescentes.Trata-se do desafio da Baleia azul.
O que esse mito na verdade reflete não é uma tendência suicida entre os adolescentes mas uma perigosa relação que a Internet nos impõe , semelhante a uma seita ou à ação de um estado autoritário.

Em Maio de 2016 a tv estatal russa Russia Today (RT) levou ao ar um programa sobre grupos pró suicidio.Uma adolescente , aparentemente , havia se matado induzida por um desses grupos.Ela teria sido seduzida por vídeos misteriosos cheios de conteúdo cifrados e códigos.O jornal russo Novaya Gazeta foi o primeiro a, especificamente , citar o desafio da Baleia azul no qual um moderador anônimo dava aos participantes tarefas a serem completadas em 50 dias.Entre esses desafios estava a auto-mutilação (por exemplo desenhar com uma lâmina de barbear uma baleia no antebraço).Ao final a pessoa deveria se matar.O nome Baleia azul veio provavelmente do hábito desses animais de se dirigirem às praias para morrer.
A justificativa para que as tarefas fosse cumpridas seria a ameaça com algum tipo de retaliação como expor segredos dos participantes às redes sociais ou de danos aos seus familiares.

O medo da disseminação de cultos suicidas entre adolescentes não é novo.Um filme de horror japonês de 2001 (Suicide club) explorava esse mito : logo no seu inicio 54 garotas jogavam-se embaixo de um trem.
A ressaltar que as vítimas reais ou fictícias nesses tipos de cultos são sempre meninas e não meninos o que sugere uma obsessão social com adolescentes mulheres e violência sexual

A história da Baleia azul reflete nossa contemporaniedade.É sobre o controle da mídia informatizada e seus tentáculos em nossos comportamentos.Nós contamos nossos segredos e intimidades para nossos computadores.Esquecemos que nossas vidas podem ser plenamente monitorizadas por hackers e assim somos todos reféns em potencial

A baleia azul é a realidade da fragilidade moral dos nossos adolescentes submissos à ameaça da exposição de seus mais privados segredos.
A baleia azul é a desproteção e exposição demasiada e a maldade silenciosa que permanece à espreita.
A baleia azul mescla em tons sombrios o medo da sobrevivência , o controle e a punição que a vida dispersa na Internet cobra dos incautos

350 milhões de depressivos

  A depressão já é a principal causa de problemas de saúde e incapacidade em todo o mundo, afetando cerca de 350 milhões de pessoas a nível global, com um aumento de mais de 18% entre 2005 e 2015 e maior incidência em mulheres do que em homens
Estes são dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) que dedicou o dia Mundial da Saúde , ocorrido em Março , para conscientização sobre o problema 

A depressão precisa ser , antes de tudo , corretamente diagnosticada.Em termos práticos consiste em : transtorno mental frequente caracterizado pela presença persistente de tristeza e perda de interesse pelas atividades que são normias para o paciente mais a incapacidade de realizar atividades normais diárias por mais de duas semanas. Ainda é comum aconteçam um ou vários destes sintomas : perda de energia; mudanças no apetite e no sono; ansiedade; concentração reduzida; indecisão; inquietude; sentimentos de inutilidade, culpa e desesperança, pensamentos de automutilação ou suicídio.

São várias as causas que se interagem de modo complexo algumas vezes baseadas na existência de certa predisposição genética . Estudos recentes demonstraram maior predisposição em mulheres vítimas de abuso de gênero. O abuso e o descuido durante a infância também influenciam em seu  desenvolvimento.

De acordo com as autoridades da OMS, “a depressão não faz distinção de idade, raça ou  história pessoal. Pode danificar as relações, interferir com a capacidade das pessoas para viverem e reduzir seu sentido de autoestima".
 
A razão pela qual escolheram o tema da depressão para o Dia Mundial da Saúde foi “o contínuo estigma, os prejuízos e a discriminação associados com a doença mental”, que, além de tudo, apresentam-se como “uma das barreiras para buscar tratamento”.

Com respeito as cifras da depressão nas Américas, por exemplo, cerca de 50 milhões de pessoas viviam com depressão em 2015 (5% da população). Entretanto, quase 7 de cada 10 pessoas com depressão não recebem o tratamento adequado que necessitam.

A OMS aponta um aumento na inversão, uma vez que, apesar da alta incidência da doença,  em muitos países não existe ou existe muito pouco apoio disponível para as pessoas com transtornos de saúde mental.Mesmo nos países desenvolvidos, quase 50% das pessoas com depressão não recebem tratamento.

Os investimentos em saúde mental beneficiam o desenvolvimento econômico. Cada dólar investido na ampliação do tratamento para a depressão, e na ansiedade conduz a um retorno de 4 dólares em melhor saúde e habilidade para trabalhar. O tratamento no geral implica em uma psicoterapia ou medicação antidepressiva ou uma combinação dos dois. 

Os riscos da paixão

Nossas ambivalèncias , dualidades , representam de modo singular a cautela para se entregar a uma paixão.Numa época de desconfiança , de não compromisso , aventurar-se numa entega é temer encargos , tensões e falta de liberdade. Inconscientemente podemos estar seguindo o que dizia Heidegger : " as coisas só se revelam para a consciência por causa da frustração que provocam ".
A maioria das pessoas espera do relacionamento apenas a satisfação.O que ultrapassa isso passa a ser excesso e descartável.Alguns sociólogos demagogos consideram nossa atualidade como uma era aberta a novas amizades , convívios , vida em comunidade e incentivam o sufocamento da paixão como uma doença arcaica.É isso o que realmente desejam aqueles que não desejam responsabilizar-se de fato pelo que sentem e pelos outros : mantenha distância de qualquer seriedade , deixe as portas abertas.

Se vive hoje em uma " rede".Ela nos possibilita uma conexão ou desconexão.Simples assim.Um paradoxo pois quanto mais pessoas conectadas mais vazia é sua essência.Dessa forma as ditas possibilidades do amor são fragilizadas antes que comecem a tomar forma.Esse padrão lentamente ( e perigosamente) se estende para todo o nosso comportamento.O filósofo Ralph Emerson afirmava que quando se esquia sobre gelo fino o segredo é fazê-lo em grande velocidade.Assim a rapidez dita a regra.Nada é durável pois não há tempo para o que é relevante.Uma paixão não tem tempo de formar-se.

Heráclito dizia que o amor e a morte são como um rio : não se penetram duas vezes no mesmo.
Não se atinge o amor sem a humildade , a coragem e a autenticidade.Numa cultura onde estas qualidades são ausentes a paixão continuará sendo uma rara conquista

O preço da felicidade

As escolhas que fazemos são delineadas pelos preços das opções que nos são apresentadas.Calculamos , de maneira consciente ou não , os custos e benefícios.No fim isso se transforma nas nossas oportunidades e assim organizamos nosso futuro.Se pararmos para analisar são os preços que nos apresentam que determinarão o real valor de nossa escolha.

Arthur Schopenhauer afirmou : " o dinheiro é a felicidade humana em abstrato;assim,aquele que não é mais capaz de usufruir da felicidade humana no plano concreto se devota inteiramente ao dinheiro".
Acreditar que o dinheiro tem pouco ou quase nada a ver com a felicidade é errado.Isso é pressupor que a riqueza apenas se fundamenta numa perda de tempo pois não é o mais importante em nossa vida.Diversos estudos têm demonstrado um grau maior de felicidade entre pessoas mais ricas.Vejamos o exemplo dos países mais ricos :as pessoas são mais saudáveis . o ambiente é mais limpo , a mortalidade infantil é muito baixa , o nível educacional é melhor.
Em 2009 uma pesquisa demonstrou que 30% dos americanos que ganhavam menos do que 24 mil dólares por ano tinham depressão , comparados a 13 % daqueles que ganhavam 60 mil dólares.Recentes pesquisas mostram que a Dinamarca e a Noruega são os países mais felizes do mundo.Ambos nações ricas.O mais infeliz é o pobre Zimbábue.

Concordo que conceituar felicidade é dificil.Gandhi por exempo dizia : " felicidade é quando o que você pensa , o que você diz e o que você faz estão em harmonia".Os psicólogos a preferem chamar de " bem-estar subjetivo".A armadilha está em confundir reações físicas e sensações de prazer imediato com uma vida feliz.O mesmo se pode dizer da infelicidade : perder algo sempre reduz nossa felicidade mais do que ganhar a mesma coisa.Não temos a capacidade de criar uma distinção exata entre escolhas que podem ter possibilidades apenas ligeiras de nos tornar felizes.

Nessa era de redes sociais estamos sempre seguindo o chamado da maioria  e , sem perceber , nossa felicidade passe a não depender apenas de nosso bem estar , mas de como o comparamos com o bem
estar dos outros.Muitos se sentem felizes quando , verdadeiramente ou não , possam ostentar para seus pares algo a mais.

Adam Smith já advertia que a idéia de se alcançar a felicidade resulta quase sempre em decepção,que cresce mas mantém a humanidade continuamente empenhada.O paradoxo que o dinheiro não pode aumentar a felicidade viria em contrário ao nosso próprio desejo e necessidade de trabalhar.Isso nos trouxe até o mundo em que vivemos

Outras moedas também adquirem a felicidade.O tempo e o amor são as mais baratas delas.

A influência secreta da Coca Cola

Um artigo que acaba de ser publicado no British Medical Journal (BMJ) desmascara uma grande farsa.Documentos comprovam em detalhes como a Coca Cola financiou conferências de jornalistas e universidades americanas no sentido de criar relatos favoráveis para o consumo de refrigerantes.

A idéia que foi propagada é que o vilão para a obesidade seria o sedentarismo e desde que você se exercitasse não haveria nenhum problema no consumo destas bebidas.Diversas campanhas atrelam a Coca Cola a atividades esportivas.Patrocínios caríssimos são realizados atrelando a marca com os mais diversos esportes.Yoni Freedhoff , professor assistente de medicina na Universidade de Otawwa comentou :" para a Coca Cola o balanço de energia tem uma mensagem crucial para que se cultive o hábito de se consumir refrigerantes com regularidade mas praticar algum tipo de esporte ".

A história toda começou com a analise de artigos publicados no ano passado no New York Times sobre a colaboração da industria com cientistas de diversas universidades em se buscar " uma solução para a epidemia de obesidade ". A Coca Cola doou um milhão de dólares para a Universidade do Colorado a fim de que palestras com convidados selecionados e pareceres favoráveis às suas estratégias fossem realizadas e tivessem a cobertura da imprensa.Após críticas que surgiram em diversas revistas médicas a Universidade relatou ter devolvido o dinheiro para a companhia.

Outros documentos obtidos pelo BMJ comprovam que esse tipo de abordagem já ocorria desde , no minimo , 2011.Uma reportagem publicada na CNN dizia que a obesidade era fruto de não se praticar atividades físicas e não tinha nenhuma relação com o consumo de refrigerantes.A Coca Cola havia pago 37 mil dólares para financiar uma palestra que deu motivo para a reportagem

A lição absurda desse caso nos aproxima de quanto as ditas verdades e modismos devem ser analisados criteriosamente por quem ainda se preza à ética.

Coca Cola dá mais vida também às mentiras

Os riscos do Ibuprofeno

Analgésicos podem ser comprados sem receita médica.Medicamentos como o ibuprofeno , o naproxeno , o acetaminofen e outros são em geral muito utilizados para o tratamento de dores de leve a moderada intensidade.Mas se usados com frequência , por longos períodos de tempo , eles serão perigosos para o coração , rins , ossos e até audição.

Estudos mais consistentes envolvem o coração.Estima-se um risco aumentado em um terço para infartos com o uso frequente do ibuprofeno em especial.Um trabalho , recem publicado , que avaliou 10 milhões de pessoas , mostrou que pacientes que estavam em uso de analgésicos tiveram um risco maior de 19% de ser hospitalizado por doença cardíaca quando comparados com indivíduos que haviam tomado as drogas no passado.Além disso tambem foram frequentes os casos de sangramento intestinal .Em 2015 o FDA (Food and Drug Administration) exigiu que fosse colocado um alerta adicional na bula dos analgésicos para o risco de doenças cardio vasculares.

Em 55 mil mulheres que participaram do estudo Nurses Health Study, aquelas que usaram regularmente o ibuprofeno por cerca de 6 anos tiveram 10% de maior risco para perda de audição.

Considerar essas medicações totalmente seguras pelo fato de serem vendidas sem prescrição é assumir a possibilidade de um dano à saúde.Cada vez mais se utilizam essa categoria de medicamentos até com finalidade preventiva : o exemplo é visto em pessoas que as ingerem antes de atividades físicas a fim de evitarem dores musculares posteriores.

O ibuprofeno também afeta a produção de prostaglandinas que ajuda na reparação e construção dos ossos.Em pessoas idosas perda de massa óssea tem sido atribuída ao seu uso frequente.

Fica a sugestão de manter a atenção para qualquer medicamento que , mesmo sem receita médica , seja consumido.Eles são drogas.E toda droga tem efeitos colaterais

Facebook e assassino

Em 2015 , Mark Zuckerberg , criador e dono do Facebook ,apresentou na sede da empresa em São Francisco , seu primeiro vídeo na plataforma da rede social.Ele expressou sua novidade para a " nossa comunidade". Caminhando pelas instalações repletas de divisórias de vidro ele disse : " No Facebook nenhum funcionário tem seu escritório...nós queremos criar uma cultura transparente ".
Estava lançado o Facebook Live , um serviço de vídeo que permite que qualquer pessoa compartilhe suas experiências com os demais usuários.

Há poucos dias um assassinato gravado em Cleveland foi postado na plataforma.Mais de mil pessoas visualizaram o vídeo antes que este fosse retirado.Um indivíduo identificado como Steve Stephens narrava seu ato como se estivesse gravando o assassinato para uma mulher com quem ele tinha um problema.O vídeo é apresentado de forma cruel.Ele escolhe , aleatóriamente , um senhor de 74 anos e ainda exige que ele pronuncie o nome da mulher antes do crime.

O Facebook se pronunciou com uma nota : este é um crime horrível e nós não vamos permitir esse tipo de barbaridade como um conteúdo a ser compartilhado.
A escolha das palavras foi infeliz.Um assassinato não é um conteúdo.Aliás pouco do que se publica em redes sociais pode ser traduzido como conteúdo.

É uma verdade aterrorizante que a violência , a auto-destruição ( a tal da Baleia Azul.....escreverei sobre isso) tem um apelo incrível de audiência.Os ataques de 11 de Setembro foram minuciosamente calculados para ter um impacto de mídia.Isso os tornou ainda mais significativos.
Imagino que Zuckberger nunca mediu a dimensão de sua criação.Ele deu , de modo indiscriminado , às pessoas , ferramentas que as podem tornar poderosas.Para o bem ou para o mal.Um caminho aparentemente sem volta.A própria companhia nunca cogitou de contratar pessoas para regular as publicações e isso iria contra seus príncipios de livre - expressão.

Esse fato não foi uma situação isolada.Em Janeiro deste ano a polícia de Chicago abriu uma investigação de sequestro de uma menina de 15 anos transmitida pelo Facebook Live.O vídeo foi visto por cerca de 40 pessoas e retirado imediatamente.A polícia da India também relata a transmissão ao vivo do suicidio de um homem por enforcamento acontecido no dia 16 de Abril.

O Facebook tem cerca de 1,2 bilhões de usuários em todo mundo.Seu lucro no ano passado foi de mais de 10 bilhões de dólares.
Um serviço desse porte enfrenta um sério dilema : as pressões econômicas extremamente lucrativas , as demandas de seus clientes , a segurança , a diversidade no perfil das pessoas.

Zuckberger afirmou : " quando você interage ao vivo você se sente conectado de um modo mais pessoal".
Levanto uma questão ética : a dimensão do compartilhamento de experiências num mundo assombrado pela imoralidade nos tornará mais ou menos estúpidos ??

Moralidade

Nós não podemos evitar a moralidade , não importa o que façamos.Todos somos , de alguma forma , moralistas.A diferença é se prestamos atenção ao que fazemos ou simplesmente aceitamos o que os outros nos dizem para fazer.
A vida não nos oferece uma lembrança a todo momento de como exercer a moralidade.Mas isso já era notado há muito tempo atrás.Sócrates tentava ensinar aos seus discípulos maneiras de se levar uma vida virtuosa.O que é novo para nós é que valores conflitantes nos são expostos a todo momento.Poucos são os costumes de concordância geral.Muitas decisões que temos que tomar são de carater ético , têm multiplas dimensões morais.Entender essa resposta emocional é o maior desafio para quem pretende fazer o que é certo.
Reconhecer que algo está errado é necessário mas o mais importante é reconhecer como não errar.

Somos todos produtos da biologia , história e instituições sociais.N a ética , a razão não pode estar dissociada da particularidade das vidas individuais.

A vida deveria ser uma tarefa a ser completada ao invés de algo a ser experimentado

A medicalização do amor

A ciência tem começado a revelar alguns dos fatores que estão na base dos sentimentos humanos. Uma espécie de análise biológica do amor. O neurobiologista Larry Young, por exemplo, tem caracterizado o amor romântico como “um coquetel de neuropeptídeos e neurotransmissores”, o que o leva a afirmar que , em breve , drogas que manipulem nosso cérebro poderão aumentar ou diminuir nosso amor por alguém . A pergunta crucial é se realmente precisamos dessa ajuda farmacológica para um sentimento tão espontâneo.

Por trás de nossos sentimentos de atração existe uma coleção de sistemas de conexões nervosas que são hipotéticamente responsáveis pelas necessidades reprodutivas de nossa espécie.A ocitocina , a dopamina , a testosterona e muitas outras substâncias parecem regular algumas de nossas emoções podendo resultar em formação de pares românticos.O que os cientistas estão avaliando é se  a administração de algum composto quimico poderia influenciar em animais a formação ou dissolução de relacionamentos estáveis e duráveis.

A grande objeção , em minha opinião , é a consequência da medicalização do amor. Joseph E. Davis ,farmacologista, a define como “o processo no qual medicamentos seriam aplicados a comportamentos , fenômenos psicológicos e experiências somáticas que fogem ao dominio da medicina “.

Não seria possível entender esse processo em termos abstratos pois medicar depende de um numero infindável de possíveis resultados , bons ou ruins. ,além de fatores indissociáveis

O grande poeta Keats afirmou que Newton havia acabado com a beleza do arco íris ao reduzi-lo a cores prismáticas.Grande parte da mágica do amor se dá por seu mistério e espontaneidade

Nós deveríamos dissecá-lo assim como o arco iris ?

Erich Fromm escreveu que existe um perigo escondido tendo em vista que o amor é algo que simplesmente acontece quando encontramos a pessoa certa mais do que qualquer esforço que façamos para entendê-lo ou torná-lo melhor

Vacina contra AIDS

Após mais de 35 anos de história da AIDS ainda estamos longe da criação de uma vacina segura e efetiva contra a infecção.Enquanto a ciência progride para o controle imunológico do Zika vírus e do Ebola os resultados para o HIV são frustantes.A variedade genética e sua capacidade de mutação são o seu grande trunfo contra uma vacina.

São mais de 20 anos de intensa pesquisa com resultados apenas modestos.Por exemplo : em 2009 uma vacina chamada de RV144 foi estudada em mais de 16.000 adultos entre 18–30 anos (metade destes receberam placebo).Sua proteção foi calculada em 31% o que é considerada baixa quando se estudam vacinas.Apesar desse resultado os pesquisadores continuam a estudar uma maneira de melhorar esse índice , talvez realizando reforços periódicos a fim de proporcionar uma melhor resposta imune ( espera-se para 2020 os resultados finais).

Outro problema que intriga os cientistas é a diversidade do HIV pelo mundo.Diferentes subtipos provavelmente dificultarão o desenvolvimento de uma vacina universal.Nós não sabemos se uma vacina poderia proteger contra cepas diferentes (chamamos este processo de proteção cruzada)

Outro campo de pesquisa envolve um tipo de proteção diferente contra o HIV : a infusão direta de anticorpos neutralizantes.Um produto chamado VRC01 (anticorpo monoclonal) está sendo testado em mulheres na África , homossexuais masculinos nos Estados Unidos , Brasil e Peru.Essa seria uma espécie de imunoterapia passiva ( os anticorpos são dados de forma pronta).Atualmente são mais de 4.000 participantes.Estes recebem a infusão a cada 8 semanas.O que já vem sendo observado é que o nível desses anticorpos caem com o tempo e doses de reforço serão necessárias.Ainda não existem estudos de custos com essa proposta.

Por enquanto a intervenção mais barata e eficaz continua sendo a prevenção....tão menosprezada nesses tantos anos de pandemia

Exatas e humanas

Um edificio é como um paciente : tem a sua pele , seu esqueleto , seu sistema vascular e linfatico , seu sistema respiratório.Toda sua construção e manutenção envolvem projetos e pessoal habilitado ( cerca de 16 especialistas estão envolvidos na atuação).Na medicina nós precisamos aprender essa correlação.Cerca de um terço dos pacientes têm no mínimo 10 especialistas participando de seus cuidados,principalmente nos seus ultimos anos de vida.A evidência do nosso descuido reflete-se nos altos indices de condutas duplicadas ou descoordenadas.

Como um paciente um edificio também envolve multiplos profissionais.E devido a natureza de sua complexidade é preciso se referir às pessoas certas para corrigir os problemas no seu príncipio.
De modo semelhante na medicina e na engenharia o homem é falível.Mas um time coeso é menos.
Nós temos que acreditar na habilidade dos experts para melhor manejar os grandes desafios.Eles , por sua vez , precisam de suas habilidades individuais para tornarem as coisas certas.
A maior causa de erro ainda é a falha de comunicação.

A engenharia pode nos ensinar a lição de como trabalhar com o melhor time e quando saber reconhecer os limites.Ela permite que as pessoas tenham poder.Em outras áreas a maioria das autoridades centralizam as decisões.Essa diferente filosofia tem sido analisada em estudos estratégicos : o que nós faríamos quando defrontados com problemas complexos , que nos tiram

completamente da rotina ?
O melhor a fazer é afastar-se do centro da decisão.Do autoritarismo.Das às pessoas um tempo para , baseados em sua experiência , exporem suas propostas.A real lição é que sob situações inesperadas , onde a necessidade de conhecimento excede nossa capacitação,os esforços têm que ser divididos

Nós não aprendemos sobre falhas em nossas vidas.Não nos são ensinadas.Somos , na medicina , obcecados durante nossa formação a compreender a cura.E quando elas surgem à nossa frente desviamos o olhar.Entender que os limites da incerteza serão nossa companhia é um primeiro e fundamental passo para que possamos construir a nossa melhor obra.

O tempo de ser

Martin Heidegger , filósofo alemão , afirmou que o sentido do ser é tempo.Isso significa : ser não é nada persistente , ser é um acontecimento.
A espiritualidade tibetana educa de modo sublime a percepção da impermanência.Ensina o desapego no aperfeiçoamento do sujeito.Quem busca a felicidade deve romper com o egocentrismo e entender o significado da palavra comunhão.
Ser é soltar as rédeas do apego excessivo.

Para usar as palavras de Umberto Eco  : a dimensão ética só passa a existir quando nos defrontamos com o outro.Para ser e exercer não estaremos sós.Será um confronto com a responsabilidade pois quem escolhe uma vida em comunidade deverá concordar com um mínimo consenso de valores , normas e respeito.

Quem escolheu o cuidado como seu trabalho deve entendê-lo como o dispositivo essencial de lidar com o mundo , sua identidade mais profunda.Cuidar deveria ser para a medicina solicitude , zelo , atenção.Entender que o cuidado surge na importância do outro.Como cuidar da doença sem entender o doente ?

O tempo de ser é a capacidade de compreender a solidão moral hoje obscurecida por tantos sintomas ou suprimida pelos sentimentos de defesa.Um ser humano marcado pela fragilidade e impermanência.Não é uma parte que adoece mas sim a vida com toda sua magnitude.Então deveríamos visar não somente a cura mas a interpretação do adoecer.Não permanecermos na superficialidade do que apenas vemos.O sufismo tem uma frase perfeita para o cuidado : um balde só se enche de água se desce ao fundo do poço.

O tempo de ser carece de uma ética da compaixão.Esse desgaste do nosso presente deveria ser o motivo maior para uma fundamentação do cuidado.Exercer a moralidade na afirmação de um novo sentido.Estamos presos em determinados modelos que nos são impostos , que impedem a real face da nossa tarefa essencial

O tempo de ser nos exige uma fidelidade de carater , um sentido para que façamos as pazes com nós mesmos.Afinal de contas vamos morrendo lentamente até acabar de morrer.

Cicatriz

...uma linha, em poesia , abre possibilidades dentro da linguagem e produz voz a partir do silêncio.
Qual a primeira coisa que um artista faz ao começar uma nova obra ? Ele traça uma linha....

A civilização da futilidade

A diversão , a fuga do tédio ,a falsa alegria dos selfies são alguns dos requisitos da nossa civilização.Uma banalização da informação percorre silenciosa nos meios sociais em que vivemos.Nossa cultura , ou o que restou dela , é propagada pelos meios " light" algo que se propõe a apenas entreter.Poucas ilhas de erudição restaram nesse oceano cada vez menor.Sem perceber temos sofrido mais influência de indivíduos rotulados como celebridades do que grandes pensadores .E seus preceitos vem na publicidade , nas mensagens curtas de um Twitter , nas páginas de revistas asquerosas.Na música , o ritmo compassado de sons tribais transforma o indivíduo.Ele se torna multidão e segue o rebanho.É apenas mais uma forma do esquecimento de si mesmo.
Os fenômenos de massa são uma característica de frivolidade.Amparam o anonimato , possibilitam a liberação instintiva o que nos aproxima de um bando primitivo.Para muitos , funciona como uma droga : afasta a dúvida , o medo da condição humana , o sentido de existir.
Uma epidemia de cultos pretende que os fiéis pratiquem a sua ética nebulosa.Poucos têm a coragem de negar essa religião permitindo que predomine a filosofia e  a ciência.
Na nossa civilização o rei é quem faz rir.Ele decreta a prioridade das imagens sobre as idéias.Ele reina soberano entre a mesmice.Nossos valores estão invertidos : a forma conta mais do que o conteúdo.
A futilidade não tem memória.Portanto não temos mais consciência plena nem remorsos.Quem vive das novidades irá muito cedo esquecer.As relações se tornam cada vez mais biológicas : o ato urgente do amor físico sem  a riqueza da sensibilidade não atenua a busca pela novo.
A refletir : podemos chamar o que vivemos de evolução ?.Qual será o futuro da ética e da moralidade num mundo de abstrações ?
A pensar...

Solidão

Descartes , Newton , Pascal , Kant , Nietzsche entre outros viveram vidas solitárias.Encontraram o valor no impessoal e provaram que a felicidade não passa necessariamente pelo convívio social.Provaram que relacionamentos de intimidades não são a fonte única de realização.Talvez esteja aí a resposta de porque os casamentos vivem dias tão instáveis.Precisamos lembrar que passamos um terço de nossa existência no isolamento do sono enquanto vários teóricos psicanalíticos nos tentam provar que não temos significado como indivíduos isolados.

A criatividade está numa constância de tentar se descobrir e adequar sua identidade na busca de um sentido de coerência.

Ernest Gellner demonstra que nossa angústia com os relacionamentos acabaram por substituir a velha ansiedade a respeito da condição solitária do imprevisível.

Acabamos por nos tornar reféns dos outros...

Insignificância

Se o planeta Terra fosse um ser humano hoje ele teria cerca de 40 anos.Ou seja , metade de sua expectativa de vida.Pela mesma analogia os humanos teriam começado a usar ferramentas há cerca de duas semanas e saíram da Africa ha 8 horas atrás.As pessoas podem se basear neste ponto como um alerta : perceber nossa brevidade , como podemos arruinar tudo com nossa ganância e incoerência.Recentemente essa perspectiva também tem sido consoladora : alguns psicólogos chamam de terapia da insignificância.Quando os eventos parecem tantos e demais um consolo pode ser a lembrança de quem somos.O filósofo Bryan Magee em seu ultimo livro (Ultimate Question) explora o tema focando a evolução humana : se dividissimos a história em porções de 100 anos , somente 20 dessas nos levariam de volta a Jesus e 21 ao imperador Julio Cesar.De repente perceberíamos que tudo parece tão longo somente porque nós comparamos à nossa experiência de minutos , semanas e anos.E resume : porquê escolher essa comparação ? " Olhe para as coisas mais objetivamente e deixaremos de lado essa obsessão com problemas menores como se fossem tudo o que nos resta".
Entre os psicólogos , os sentimentos de insignificância são sempre observados quando os pacientes se comparam a outras pessoas : celebridades , parentes e amigos bem sucedidos.Ainda mais nessa febre de redes sociais,Um modo de pensar a existência é a insignificância cósmica.A chave para encontrar o consolo não é se tornar um niilista mas sim enxergar a fugacidade de sua realidade como uma razão para cuidar das pessoas e eventos ao seu redor

As mortes pelo tabagismo

A despeito de tanta informação e controle o tabagismo continua a crescer no mundo.Um estudo recém publicado na jornal The Lancet mostra que as companhias produtoras de cigarros têm investido em novos mercados , especialmente nos países em desenvolvimento.Os autores mostram um número assustador : um em cada 4 homens no mundo é um tabagista diário.Fumar permanece como o segundo maior fator de risco para morte precoce.O Global Burden of Diseases avaliou o vicio em cigarro em 195 países no período entre 1990 e 2015.O resultado mostrou que cerca de um bilhão de pessoas fumam diariamente.Em 1990 eram 870 milhões de indivíduos.Esse aumento foi provocado pelo novo mercado investido : países onde não se realizam tantas campanhas contra o tabagismo e onde a informação é falha.
O número de mortes relacionadas ao tabaco passou de 6,4 milhões em 2015 , um aumento de 4,7% comparado a 2014.Em países onde a combinação de taxas de impostos elevadas em relação ao preço do cigarro , programas de educação e alertas de riscos de câncer nas embalagens houve uma redução significativa dos danos.
Nos últimos 25 anos , o Brasil diminuiu o percentual de fumantes de 29 % para 12% nos homens e de 19% para 8% nas mulheres.Bangladesh , Indonésia e Filipinas não apresentaram mudanças nos dados.A Rússia presenciou o aumento em 4% de fumantes entre mulheres
A triste conclusão do estudo : uma em cada dez mortes no mundo está relacionada ao tabagismo

Médico ou Robô ?

Há um certo tempo os médicos têm utilizado robôs para cirurgias ginecológicas e urológicas.Mas na última década a cirurgia robótica vem se tornando frequente em todos os tipos de procedimentos.O numero de robôs em atividade em centros cirurgicos , nos Estados Unidos , aumentou em 5 vezes entre 2011 e 2013.Existem apelos naturais para despertar , no mínimo , curiosidade com esta novidade.Cirurgias tradicionais tipicamente envolvem grandes incisões na pele.Cirurgias robóticas deixam cicatrizes quase imperceptíveis.Também são associadas com menor perda de sangue , menos dor após a cirurgia  e recuperação mais rápida.
Mas existe muita coisa que os robôs não podem fazer.Eles não garantem necessariamente um melhor desfecho ( isso é comprovado principalmente em cirurgias oncológicas).E os robôs não melhoram a habilidade dos cirurgiões.
Também têm sido demonstrados riscos : em Março de 2013 um relato do Massachutts Board of Registration in Medicine relatou que cirurgiões inexperientes com robôs levavam mais tempo para operar.Procedimentos que normalmente levariam 2 horas se estendiam por mais de 8.

Então chegamos à questão preço.Um robô custa milhões de dólares e cada procedimento envolve outros milhares nos equipamentos e insumos.Estudos mostram que se gastam a mais dois mil dólares por cirurgia robótica ( e não se observam melhoria nos indices de complicações)

Outro problema é o chamado marketing de resgate.Hospitais que contam com essa tecnologia proclamam em seus sites que a cirurgia robótica " é o mais efetivo e seguro tratamento cirúrgico".Há uma enganosa propaganda que não encontra subsídios científicos.

A introdução de uma nova tecnologia sempre vem com questionamentos.Uma discussão similar ocorreu quando os cirurgiões começaram a operar pela video laparoscopia.Leva-se um tempo para que as técnicas sejam assimiladas , incorporadas e possam oferecer vantagens para o paciente com segurança.Uma nova ferramenta nem sempre é a correta.

E toda cirurgia , independentemente de como seja realizada , permanece um feito absolutamente humano

Decisões e omissões

O sucesso na medicina tem dimensões que não podem ser encontrados no senso comum.As decisões e omissões são de carater moral , por natureza.Nós encaramos expectativas assustadoras em nossa tarefa de lidar com a doença e capacitar cada ser humano a levar uma vida mais longa e livre de fragilidades conforme a ciência nos limita.O conhecimento nos persegue na dualidade de ser amplo e incompleto.E assim vamos tentando atuar com rapidez e consistência mesmo que o dia requeira atender dezenas de pessoas e nos envolver com outras centenas - técnicos , enfermeiros , outros especialistas etc -.Esperamos fazer nosso trabalho com humanidade, gentileza e importância no cuidar.E acordamos a cada dia sabendo que este será sempre diferente e desafiador.
Encaramos obstáculos que nos parecem tão semelhantes e diferentes ao mesmo tempo.Mas temos que avançar , refinar , melhorar.

O médico que entende seu destino sabe a que medicina requer 3 fundamentos para seu sucesso.
O primeiro é a diligência , o cuidado e o interesse em fazer algo
O segundo é fazer o certo.Como uma profissão humana será sempre falivel.Então será prudente atuar sem avareza , arrogância , insegurança e desentendimento.Bases dos erros.
O terceiro é a humildade.Isso demanda mais do que o reconhecimento de ver uma falha.De mudar.

A melhora é um trabalho perpétuo.Num mundo caótico , desorganizado e às vezes enfadonho , a medicina não pode ser apartada da realidade.
Para quem decidiu ser médico a questão não é se aceitará a responsabilidade.A questão é : tendo aceito como pode fazer do seu trabalho o melhor.

O modismo das dietas

Periodicamente somos alertados sobre os perigos de alguns alimentos na nossa dieta.Foi assim com o colesterol na década de 90.As gorduras têm sido incriminadas também.O glúten.A lactose.Hoje as pessoas buscam melhorar o " bom colesterol" com os benefícios da dieta do Mediterrâneo , rica em azeite de oliva.Até pouco tempo atrás a dieta de Atkins enriqueceu o seu idealizador.E agora existe a proposta da dieta Paleolítica : dieta com alto teor de proteínas e alimentos com colesterol.
É possível acreditar cegamente nessas propostas ?

Em 2003 a revista New England Journal of Medicine publicou um artigo endossando os beneficios da dieta do Mediterrâneo.O estudo detalhou os resultados de modo científico concluindo que haveria uma redução de cerca de 30% no risco de doença cardio vascular para quem a seguiu rigorosamente.Porém esse numero surgiu de uma pressuposição projetada no tempo.Se avaliássemos com rigor estatistico o real beneficio não ultrapassaria 3,8 %.
Em minha opinião , esse é um resultado emblemático.Revela o perigo dos modismos

Livros são lançados a todo momento e , a despeito de tentarem mostrar alguma real evidência , são armadilhas para nos infringir uma dieta e uma proposta disfarçada de cardápios elaborados.Um marketing enganoso e que será trocado em pouco tempo por outra proposta oportunista.
Recentemente foi publicado nos Estados Unidos um livro chamado " The secret life of fat " ( a vida secreta da gordura) de Sylvia Tara.Entre tantos absurdos a autora defende a tese que um vírus, o Ad-36, causaria a obesidade, Trata-se de um agente que infecta galinhas e que estas passariam o vírus para os humanos.Não existe nenhuma comprovação desse fato e muitos vírus presentes em animais são confundidos com o Ad-36.

Preocupar-se com dieta é muito peculiar a nossa espécie.Em 1825 , um advogado francês , Jean Savarin ,escreveu um famoso tratado " the physiology of taste" ( a fisiologia do gosto) no qual argumentava que os verdadeiros carnívoros e herbívoros não engordavam.Isso só aconteceria quando começassem a ingerir grãos e trigo.Muitos anos depois , Horace Fletcher , conhecido como o grande mastigador , deu seu remédio para a obesidade : mastigar bem devagar os alimentos.

O grande problema com o modismo das dietas é que pretendem nos influenciar dando-nos simples respostas : gorduras , carboidratos , quantas refeiçoes fazemos , o intervalo entre elas etc.Eles pretendem trazer a esperança que se consertarmos alguns hábitos nossa vida será salva.Promessas furtivas que se desmancham em pouco tempo.

A ciência é uma busca de confirmação de certezas provisórias.Isso poderia ser traduzido de forma prática em nossas vidas em uma norma : o bom senso deve prevalecer.Comer e se exercitar com moderação.Manter uma dieta balanceada com quantidades de proteína , gordura e carboidratos.Não esquecer das porções de frutas e legumes.E se deliciar ocasionalmente com uma fatia de bolo de chocolate.

The Doctor

Nós nos lembramos do medico como parte da comunidade.Era possível vê-lo pela cidade.Nós sabíamos que sua esposa estaria levando os filhos para a escola todas as manhãs.Nós sabíamos onde encontrá-lo quando necessário e também sabíamos que ele não saberia responder a todas as nossas questões.Mas ele nos ouviria e teria palavras de conforto para todos os males.Desse modo ele cuidava e muitas vezes curava.Ele nos oferecia muito mais do que comprimidos.Ele nos oferecia ajuda com a vida e com a morte.Nós iríamos procurá-lo pessoalmente ou com nossa família e tínhamos , no fundo , a consciência que éramos todos humanos e que ele estaria sempre tentando o nosso melhor.

Nós agora vemos enfermeiras , médicos muito mais atarefados.Parecem estar com pressa digitando em seus computadores , atendendo seus celulares , olhando mais para uma tela luminosa do que para os nossos olhos.Também notamos que as frases são curtas , calculistas , objetivas e que parecem ser sempre as mesmas.Parece que os ouvidos não fazem questão de ouvir.

Nós vemos em alguma sala de espera a pintura de Luke Fildes , The Doctor .E nos permitimos pensar que aquele médico era esse que conhecemos tão bem mas que foi se anulando com a tecnologia e com a insensibilidade.

Olhamos para as pessoas que aguardam as consultas e descobrimos que compartilhamos as mesmas angústias.A tela imortalizou o médico que precisamos e o reteve para sempre como uma imagem

Conhecimento

Em 1945 , o filósofo britânico Gilbert Ryle escreveu sobre os dois tipos de conhecimento.

Uma criança sabe que uma bicicleta tem duas rodas , que seus pneus são cheios de ar , e que você faz com ela ande acionando seus pedais.Ryle chamou este tipo de conhecimento - factual - " conhecendo aquilo ".Mas aprender a pedalar uma bicicleta envolve outro tipo de aprendizado.Uma criança aprende com suas quedas , seu desequilíbrio , sua indecisão.Ryle deu o nome a este conhecimento - experimental , baseado em habilidades , implícito - " conhecendo como ".
Os dois tipos de conhecimento poderiam ser interdependentes : você deveria usar o conhecimento factual para se aprofundar no implícito , e vice-versa.Mas Ryle alertou contra a tentação de pensar que " conhecendo como " pode ser reduzido a " conhecendo aquilo" - um manual de instruções não fará uma criança pedalar uma bicicleta.
Nossas regras só fazem sentido porque sabemos como usá-las.

Cérebro e coração estressados

Cada vez mais as pessoas experimentam situações de stress no cotidiano.Excesso de trabalho , insegurança e infelicidade , pobreza são circunstâncias que resultam em uma crônica condição que pode ocasionar distúrbios psicológicos como a depressão.
Alguns estudos publicados no passado relataram um aumento no risco de doenças cardio-vasculares nestes pacientes.Em 2004 , Rosengren , publicou um trabalho mostrando que pacientes que tinham a percepção do stress apresentavam uma maior prevalência de infarto do miocárdio.Porém , a direta relação causal e os mecanismos fisiopatológicos que envolvem o problema não foram claramente elucidados.Provavelmente a dificuldade estava ligada a uma maneira de padronizar os sintomas ( o stress varia de pessoa para pessoa)
A revista britânica The Lancet acaba de publicar um estudo que mostra a atividade da amigdala ( uma pequena estrutura cerebral....não confundir com aquela localizada em nossa garganta) como de fundamental importância na gênese dos problemas relacionados ao stress.
293 indivíduos foram avaliados , sem história de doença cardiovascular , através do exame PET-scan.
Após um período de seguimento de 3-7 anos a atividade da amigdala foi significativamente associada com o indice de doenças cardiovasculares.O PET scan mostrou resposta inflamatória que é a mediadora na geração de problemas circulatórios.Além disso o estudo realizou exames laboratoriais que também mediram proteínas inflamatórias como a interleucina-6.Pacientes que desenvolveram problemas cardíacos tinham valores elevados destas e também de outros marcadores.
Os autores sugerem que a avaliação do grau de stress seja valorizada na analise de risco para o desenvolvimento de doenças cardiovasculares.
Cérebro e coração compartilham os benefícios de nosso bem estar