Viktor Frankl escreveu “ viva como se já estivesse vivendo
pela segunda vez” em sua obra-prima de 1946 sobre a busca humana por
significado. E complementa “viva como se você tivesse agido da primeira vez tão
errado quanto está prestes a agir agora!”
Vivemos apenas uma vez, sem ensaio ou reprise – um fato ao
mesmo tempo tão opressivo e tão cheio de possibilidades que nos torna, nas
palavras sublimes da poetisa polonesa Wislawa Szymborska, “mal preparados para
o privilégio de viver”. O tempo todo, avançamos acompanhados pelos espectros de
versões de nós mesmos que falhamos ou escolhemos não nos tornar. Nossas vidas
vividas, segundo o psicanalista Adam Phillips, podem se tornar um luto
prolongado ou um acesso de raiva sem fim pelas vidas que não fomos capazes de
viver. Mas as isenções que sofremos, sejam elas forçadas ou escolhidas, fazem
de nós quem somos. Realizamos esta dança existencial de sim e não ao ritmo de
uma pergunta imutável: como sabemos o que queremos, o que querer ?
O escritor tcheco-francês Milan Kundera examina nosso
passeio ambivalente pela vida com graça e precisão poética incomparáveis em
seu romance de 1984, A Insustentável Leveza do Ser - um dos livros mais
gratificantes do século passado. Como o amor aguça todos os nossos sentidos e
amplifica as nossas preocupações existentes, talvez seja nele que as
ambivalências centrais da vida se tornam mais desorientadoras - algo que ocorre
com o protagonista do romance, Tomáš. Ele passou a sentir um amor inexplicável
por uma completa estranha.
Mas foi amor? … Seria simplesmente a histeria de um homem
que, no fundo consciente da sua inaptidão para o amor, sentiu a necessidade
ilusória de simulá-lo? Ele percebeu que não tinha ideia se era histeria ou
amor. A mulher acaba por se tornar esposa de Tomáš, o que apenas afirma ainda
mais que mesmo a escolha mais acertada pode apresentar-se a nós envolta em
incerteza e dúvida desde o início, sendo a sua justeza apenas cristalizada na
clareza da retrospectiva.
Nunca saberemos o que querer, porque, vivendo apenas uma
vida, não podemos compará-la com as nossas vidas anteriores nem aperfeiçoá-la
nas nossas vidas futuras. Não há meios de testar qual decisão é melhor, porque
não há base para comparação. Vivemos tudo como acontece, sem avisar, como um
ator que recebe um texto de ultima hora. E o que pode valer a vida se o
primeiro ensaio para a vida é a própria vida? É por isso que a vida é sempre
como um esboço.Um esboço para nada, um esboço sem imagem.
A Insustentável Leveza do Ser é um dos livros que mais
ampliam a vida de quem o lê.
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