Neste momento desafiador em que vivemos é uma árdua tarefa
ser otimista. As consequências das mudanças climáticas , os conflitos
ideológicos e religiosos , os expoentes do fascismo , a pandemia...tudo se
configura ameaçador num mundo liquido.
É um lugar comum , diante de tantas dificuldades ,se comparar
o presente com um passado na maioria das vezes saudoso . Num artigo para a
revista Wired , o então presidente dos
EUA Barack Obama escreveu (com otimismo característico): ...se você tivesse que
escolher qualquer momento no curso da história humana para estar vivo, deveria
escolher este.' No seu livro C'était mieux avant!('Antes era melhor!'), o
filósofo francês Michel Serres elogiou os sucessos da ciência e da razão
enquanto zombava de nossa tendência de ver o passado através das lentes
seletivas e tingidas de nostalgia. Serres lembra que 'antes' havia mais
trabalho, em condições mais difíceis, com menos suporte de tecnologia. Havia um
saneamento precário e cuidados de saúde menos eficazes. Houve mais conflito,
mais violência. Os 'bons e velhos' dias talvez não fossem tão bons em
comparação com o presente. O psicólogo canadense Steven Pinker defenderia uma
visão semelhante apenas um ano depois em seu livro Enlightenment Now . A ideia
de que o mundo está piorando, argumentou ele, é equivocada.
Os dados mostram claramente que Obama, Serres e Pinker estão
certos sobre certas medidas objetivas de bem-estar - mas muitas pessoas se
sentem infelizes. Em alguns lugares, incluindo os EUA, pesquisas mostram que a
idéia de felicidade está realmente em declínio .
Como devemos ver o estado do mundo: com otimismo ou
pessimismo? Essa resposta exige uma analise do balanço entre a bondade e os
males que nos afligem. Podemos reconhecer que as coisas melhoraram
dramaticamente e ainda sermos mais prudentes quanto à nossa situação atual e
perspectivas futuras.
A maioria das pessoas tem percalços ao longo da vida lidando
com aspectos dolorosos da realidade por meio de uma mistura de ignorância,
indiferença e evasão. Embora os avanços históricos devam ser celebrados, eles
podem, se não formos cuidadosos, nos distrair de lidar com fatos difíceis; e
não aceitar esses fatos difíceis pode nos impedir de viver bem.
Quando olhamos para a condição humana é preciso entender a
inevitabilidade do sofrimento - tanto para nós quanto para aqueles que nos são
próximos. Essas coisas pesam na consciência da maioria das pessoas em algum
momento. Muitos experimentam a dolorosa solidão da vida, uma incapacidade de
comunicar plenamente cada experiência aos outros ou de compreender a deles. E
apesar das várias formas de progresso, continuam a existir injustiças inadmissíveis.
Poucos refletem sobre nossa impotência para o destino final
de tudo. A natureza efêmera de nossos projetos e realizações, poucos dos quais
perduram por um período de tempo significativo. Não importa quantos anos extras
de vida a tecnologia médica nos deu, se uma pessoa está vivendo uma vida que
ela sente ser sem sentido - ou significativa de uma forma superficial – os anos
adicionais não se traduzem em anos extras de satisfação, muito menos de
realização ou alegria. Sabemos que isso é verdade em algum nível abstrato, mas
temos dificuldade em enfrentá-lo ou entendê-lo. Em vez disso, a maioria das
pessoas escolhe , por fuga talvez, lidar com o lado mais escuro da realidade
por meio de uma mistura de ignorância, indiferença e evitação.
Uma razão óbvia pela
qual devemos pensar mais sobre a dura realidade da vida é que não podemos
evitá-la. Os fatos irão se impor sobre nós. Nenhum progresso ou riqueza nos
permitirá ignorá-los para sempre. Por fim, nossa relutância em ver a realidade
como ela é leva a formas adicionais de sofrimento como resultado de prioridades
desalinhadas.
Nosso destino espinhoso é ver a realidade com os olhos
abertos desde o início e ordenar nossas prioridades com base em uma avaliação
clara das coisas. Quando, distraídos por nossa boa sorte (saúde, riqueza,
segurança), ignoramos as duras realidades que não podemos evitar em nossa
própria vida e desconsideramos as de outras pessoas estamos numa espécie de
catarse passageira.
Jamais eliminaremos a perda, a decadência, o sofrimento e a
morte do mundo. Não se trata de aceitar o mundo como ele é - seja porque a
teodicéia nos diz que é perfeito, ou porque o filósofo alemão Friedrich
Nietzsche nos diz que devemos dizer "sim" a cada detalhe "
inexpressivamente pequeno", ou por alguma outra razão. A questão não é
ceder ao desespero ou insistir obsessivamente nas maneiras pelas quais a
realidade não é o que poderia ser. Isso não é mais aconselhável do que fechar
os olhos às falhas do mundo. A questão, ao contrário, é dar à realidade o que é
devido. Quando o fazemos, encontramos mais do que apenas uma catástrofe. Se os
olhos abertos nos permitem ver os naufrágios do mundo com mais clareza, eles
também nos mostram outra coisa.
A honestidade clara sobre as coisas acaba com a felicidade
ingênua ou inocente mas abre a possibilidade para algo mais maduro. Os humanos
são os únicos seres que, além de experimentar as coisas como boas em relação
aos seus próprios desejos, interesses e objetivos, também podem apreciá-los
como bons em si mesmos, bons independentemente de sua relação com nós,totalmente independente
de nosso próprio ser.
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